Teorias sobre a industrialização brasileira

 

 

Armen Mamigonian

Departamento de Geografia da USP

 

 

 

I - Teorias sobre a industrialização brasileira e latino-americana

 

A industrialização brasileira é tema de debate da nossa intelectualidade desde as décadas de 20 e 30. O. Brandão publicou Agrarismo e Industrialismo em 1926[1] e R. Simonsen divulgou em 1939 a primeira história da industrialização brasileira[2]. Nos dois casos trataram-se de intelectuais engajados, o primeiro, dirigente comunista e o segundo, líder industrial, ambos defensores da industrialização, numa época em que se considerava o Brasil como “país essencialmente agrícola” e cuja industrialização sofria grandes resistências dos setores ligados à divisão internacional do trabalho, interna e externamente. Assim, precocemente as esquerdas brasileiras tornaram-se, junto com a burguesia industrial, defensoras do processo de industrialização.

        A industrialização brasileira recebeu um capítulo na História Econômica do Brasil, de C. Prado Jr., publicado em 1945[3] e mais tarde mereceu interpretações mais aprofundadas nos escritos de dois economistas ligados aos órgãos de planejamento governamentais. I. Rangel e C. Furtado[4], publicados na década de 50. Paradoxalmente, o tema da industrialização só despertou o interesse dos professores universitários após a publicação de Formação Econômica do Brasil, de C. Furtado, quando o Departamento de Sociologia da USP entrou no debate, sobretudo F.H. Cardoso e O. Ianni[5]. No fundo, até então, a universidade não julgava a temática relevante, pois não percebia as dimensões econômico-sociais e políticas que o processo de industrialização já alcançava. O debate que se seguiu, com a participação de numerosos pesquisadores universitários brasileiros e estrangeiros, iria demonstrar o caráter controvertido das interpretações, tais como: 1) as conjunturas de crise das exportações (guerras mundiais, crise de 1929 etc.) tinham sido favoráveis ou desfavoráveis ao avanço industrial?, 2) a condição de periferia do sistema mundial capitalista bloqueava ou não a industrialização? 3) a que classes sociais couberam as primeiras iniciativas industriais: aos fazendeiros, aos comerciantes de export-import, à pequena burguesia e outros setores populares? etc. Paralelamente, a questão da industrialização havia chegado na época ao próprio âmbito popular, onde também se veiculavam opiniões divergentes: a industrialização havia começado com Volta Redonda ou com a implantação das usinas hidrelétrica da Light? A indústria brasileira era multinacional? Etc. Desde então o avanço industrial brasileiro foi considerável, assim como se fez um longo percurso intelectual, que provocou alguns esclarecimentos, mais ainda hoje as interpretações continuam contrastantes, pois refletem as vinculações entre elas e as classes sociais interessadas no processo.

        Nas esquerdas brasileiras três teorias referentes à economia brasileira em geral e à industrialização em particular, tiveram papel hegemônico na luta intelectual, sucessivamente: 1) a teoria da CEPAL, que popularizou a expressão “industrialização por substituição de importação”, dominou o ambiente cultural de 1955 a 1964, 2) a teoria da dependência, que teve grande aceitação no período seguinte ao golpe militar, enfatizou a subordinação da industrialização aos interesses do centro do sistema capitalista, 3) a teoria dos ciclos econômicos, com grande aceitação recente, reconhece o enorme dinamismo do processo de acumulação capitalista brasileiro.

 

1. As idéias da Cepal

        As idéias da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina – ONU) foram fortemente hegemônicas nas esquerdas brasileiras, e mesmo latino-americanas, dos fins da década de 50 até meados de 60. Elas surgiram fortemente ligadas ao processos de industrialização e aos problemas decorrentes, pois desde fins do século XIX grandes indústrias foram se instalando em todas as cidades portuárias brasileiras, desde Belém do Pará e São Luís do Maranhão até o porto do Rio Grande, criando uma nova realidade no interior da economia agroexportadora, sendo que o mesmo acontecia em quase toda a América Latina, como na Argentina, no México, na Colômbia etc.

        No Brasil, R. Simonsen destacou a conjuntura da Primeira Guerra Mundial e da crise de 1929 como favorável à industrialização, em vista da incapacidade de importação do Brasil, inaugurando entre nós a visão de uma industrialização que se impulsionava nos momentos de crise das relações centro/periferia, substituindo importações tornadas problemáticas pela queda das nossas exportações[6]. R. Simonsen foi também o primeiro a chamar a atenção para a necessidade do planejamento governamental como instrumento de aceleração da industrialização, combatendo as concepções antiintervencionistas de E. Gudin, para quem as vantagens comparativas internacionais ligadas às exportações agrícolas eram as que mais interessavam ao Brasil, nos moldes da política econômica da Velha República[7].

        Independentemente de R. Simonsen, na Argentina R. Prebisch analisou as relações comerciais entre América Latina e os países do centro do sistema capitalista desde o século XIX até após a Segunda Guerra Mundial, concluindo que os preços dos produtos primários exportados tinham a tendência a sofrer uma queda em relação aos produtos industriais importados, que significava uma tendência ao empobrecimento. A correção das tendências dependia da ruptura da divisão internacional do trabalho, via industrialização dirigida pelo Estado[8]. A deterioração dos termos de intercâmbio entre a América Latina e os centros dinâmicos capitalistas, segundo Prebisch, resultava da diferença de comportamento da demanda de produtos primários em relação à demanda de manufaturados, pois 1) a elevação da renda popular no centro não podia significar aumento proporcional de consumo de alimentos importados e 2) as matérias-primas compunham em menor proporção os produtos industrializados em vista do avanço tecnológico e do uso de sintéticos. Além disso, a abundância de mão-de-obra na periferia levava a tendência à queda dos salários e assim dos preços dos produtos primários, diferentemente da escassez da mão-de-obra no centro, que provoca aumento dos custos e elevação dos preços dos manufaturados. Assim, o fosso entre centro e periferia tendia a aumentar e sem intervenção estatal o processo era irreversível. Mas Prebisch, como os cepalinos em geral, não levava na devida conta o imenso avanço industrial que já estava em processo na América Latina, pois na Argentina já em 1929 o setor industrial alcançava 22,8% do PIB e atingia 14,2% no México e 11,7% no Brasil[9].

        A industrialização como processo de substituição é a tese central da Cepal, que parte dos obstáculos externos ao desenvolvimento. Como R. Simonsen e R. Prebisch haviam assinalado, a queda na capacidade de importação da economia, decorrente da permanente dificuldade cambial e das crises do comércio internacional estimulava a produção industrial interna, que punha em ação um mecanismo circular, pelo qual toda nova etapa na substituição de importações implicava aumento das necessidades de novas importações superior ao crescimento da capacidade de importação, levando a um dispêndio de divisas superior à economia realizada, agravando o déficit externo, o que reincentivava o processo de substituição, conforme o esquema de G. Mathias[10]:

 

 

            Tais obstáculos externos constituem também estímulos ao desenvolvimento industrial, como já foi assinalado, e além disso o avanço industrial era visível desde antes de 1930. Ainda assim, a queda dos termos de intercâmbio entre centro e periferia significava empobrecimento crescente, pois o excedente econômico criado na periferia acabava sendo transferido, na sua maior parte, para o centro pelos mecanismos de troca internacional, e o que restava na periferia, segundo a Cepal, absorvido improdutivamente pelas classes dominantes e médias perdulárias, em gastos ostentatórios. Percebe-se, assim, o caráter estagnacionista do raciocínio cepalino: 1) o comércio internacional era desfavorável, 2) o excedente econômico era, assim, absorvido em maior parte pelo exterior, 3) o excedente econômico que permanecia na periferia era desperdiçado[11]. Agravando o raciocínio cepalino estagnacionista, havia também obstáculos internos, como 1) a concentração de rendas muito grande, e assim o mercado consumidor era limitado para absorver a produção industrial, 2) a tecnologia importada, dado o avanço do centro, era de dimensões superiores às possibilidades do mercado, gerando unidades de grande porte, com capacidade ociosa, provocando custos elevados, além de que não absorvia mão-de-obra, restringindo ainda mais o mercado consumidor e exigindo, assim, correções no sentido de tecnologias mais modestas, compatíveis com as necessidades de industrialização periférica, 3) tendências à importação de modelos de consumo em conseqüência da concentração de rendas, provocando a produção precoce de artigos de luxo e o desperdício do excedente econômico, 4) o excedente sendo insuficiente, pela sua absorção externa e desperdício interno, havia necessidade de apelar para as poupanças externas, sob forma de empréstimos bancários ou inversões diretas.

        A Cepal apontava como medidas corretivas dos bloqueios a adoção de reformas estruturais levadas a efeito pelo Estado, principalmente a reforma agrária, pois a concentração de terra provocava restrições insuperáveis ao mercado interno, impedindo o avanço industrial, além de que a agricultura latifundiária trabalhava com técnicas primitivas, gerando baixa produtividade e insuficiência de alimentos e matérias-primas nas cidades, e assim elevação dos custos industriais. A transferência de mão-de-obra da agricultura para a indústria provocaria automaticamente, na visão da Cepal, distribuição de renda, decorrente do aumento de produtividade, e a reforma agrária ampliaria o mercado interno, atendendo às necessidades do avanço da industrialização.

        Os estudos empíricos de R. Simonsen e C. Furtado[12] enfatizaram a importância da introdução do trabalho livre na economia cafeeira, com a abolição da escravatura. Enquanto prevaleceu o trabalho escravo, as necessidades de consumo das fazendas de café foram atendidas pelas atividades de subsistência realizadas nas horas deixadas vagas pela cultura de exportação, ou pelas importações, que abasteciam o consumo dos fazendeiros. A mão-de-obra livre foi usada para atender exclusivamente à lavoura de café e era remunerada com dinheiro, o que permitia adquirir alimentos e produtos industriais. Os lucros da produção cafeeira se transferiam para as atividades industriais por intermédio do sistema bancário. Com o tempo as atividades industriais acabaram gestando um centro dinâmico na economia brasileira.

 

2. A teoria da dependência

        No tempo em que a teoria da Cepal foi hegemônica nas esquerdas brasileiras (1955-64), houve bom entrosamento entre suas idéias e as do PCB. Formou-se uma verdadeira frente única entre as interpretações dos industriais e dos comunistas, como precocemente O. Brandão e R. Simonsen demonstraram, ao combater a idéia do Brasil “país essencialmente agrícola”, que servia aos interesses agroexportadores[13]. Segundo o PCB o latifúndio feudal dominante produzia gêneros de exportação, que interessavam aos países centrais, responsáveis pelo abastecimento do país em produtos industrializados, prejudicando a incipiente industrialização, que também era bloqueada pela pobreza da população rural, sem poder aquisitivo. O imperialismo controlava as finanças e o comércio de exportação, funcionando como uma bomba da sucção, carreando as riquezas nacionais para o exterior. O PCB se aproximava da Cepal pela visão estagnacionista, por admitir inversões industriais estrangeiras, desde que não norte-americanas e pela defesa das reformas de base, no início da década de 60, como indispensáveis à continuidade da industrialização.

        Se as colocações de C. Furtado e da Cepal conseguiram aliados, sobretudo nas idéias do PCB sobre a industrialização brasileira, criaram também adversários. C. Furtado foi criticado por não ter desenvolvido empiricamente seu modelo explicativo, deixando de se referir mais explicitamente aos fatores sociais responsáveis pela criação do mercado interno e pela gênese dos capitais invertidos na industrialização, além de ter se restringido basicamente à análise da industrialização no interior da economia cafeeira, não dando atenção ao processo no conjunto brasileiro.

        A ausência de referência à origem dos empresários nas análises de R. Simonsen e C. Furtado na verdade estava vinculada à necessidade de não ofender a poderosa oligarquia agrária, que divulgava a idéia de seu próprio papel diretor na implantação da atividade industrial. No entanto, autores marxistas como C. Prado Jr. e L. Basbaum[14], entre outros, já haviam assinalado o papel fundamental dos imigrantes como os principais responsáveis pela gênese da industrialização brasileira. Por outro lado, F.H. Cardoso e O. Ianni[15] vincularam a criação do mercado interno aos estímulos da especialização provocados nas fazendas durante as conjunturas de valorização dos gêneros de exportação, que permitiam a produção por terceiros dos alimentos e produtos industriais. E nessas ocasiões, quando as atividades das fazendas de café tornavam-se muito lucrativas, geravam excedentes aplicáveis em outras atividades (estradas de ferro, indústrias, etc.), tese que posteriormente foi defendida por vários pesquisadores.

        Estas formulações visavam diminuir as interpretações que enfatizavam a importância dos imigrantes e assim combater a idéia do self-made-man, tão antipática à esquerda. Nesta direção W. Dean foi mais longe, insistindo no papel dirigente dos fazendeiros de café, que teriam conduzido a economia brasileira da agroexportação ao sistema industrial existente em meados do século XX, além de relacionar os avanços da industrialização com as épocas de prosperidade da economia cafeeira, criticando R. Simonsen e C. Furtado, que vinculavam a industrialização às crises do comércio exterior. Assim, já que o país não era mais “essencialmente agrícola”, os ideólogos da agroexportação trataram de se apropriar da industrialização[16], como após 1964 iriam se apropriar da idéia da necessidade de intervencionismo estatal.

        Com o golpe militar de 1964, as divergências no interior do bloco Cepal-PCB acabaram aflorando, dando origem à teoria da dependência, hegemônica nas esquerdas durante a segunda metade dos anos 60 e primeira dos anos 70. Logo após o golpe, C. Furtado via o Brasil como um “país sem futuro” e estagnado, pela paralisação dos investimentos industriais, pela pecuarização do campo etc.[17]. Os dependentistas reinterpretavam a história e analisavam a conjuntura econômico-política de uma nova maneira. Assim, os arcaísmos feudais apontados pela Cepal nada mais eram do que manifestações do subdesenvolvimento capitalista, pois o Brasil, como toda a América Latina, era visto como fruto da expansão capitalista da Europa, tendo sido capitalista desde seus inícios[18]. Em 1966-67 para C. Furtado o Brasil não tinha futuro, enquanto para os dependentistas não tinha passado.

        Os dependentistas reconheciam que havia ocorrido na década de 50 um grande avanço na industrialização brasileira, diferenciando-se da análise Cepal-PCB, mas que isto se devia à maior dependência e atrelamento à economia mundial capitalista, sobretudo pela presença maciça das multinacionais no setor industrial. A burguesia nacional abdicara de sua independência, a industrialização tinha deixado de ser um processo autônomo para ser associado, num tripé constituído pelas multinacionais, estatais e privadas nacionais, como no caso da indústria automobilística, onde as estatais se encarregavam das chapas de aço, as privadas nacionais eram fornecedoras das autopeças e as multinacionais eram montadoras e detinham a liderança[19].

        Mas a industrialização havia criado mais problemas do que os existentes anteriormente, pois com um exército industrial de reserva numeroso e o uso de tecnologia sofisticada importada, a criação de empregos tinha sido pequena, a produtividade havia aumentado e os salários haviam caído, ocorrendo uma superexploração do trabalho e lucros extraordinários, situação que exigia a presença de ditaduras militares colonial-facistas. A dependência, que se tornou crescentemente interna à economia brasileira, se manifestava agora pelo crescimento das remessas de lucros e royalties, pagamento dos empréstimos externos etc., não dando margem à apropriação interna do excedente econômico. Além disso, com a contração do mercado interno a economia entrava em profunda crise, caracterizada como crise no processo de substituição de importações, pois as substituições “fáceis” já haviam sido realizadas. A solução encontrada havia sido a exportação de produtos industriais, passando o Brasil a ser um país sul-imperialista na América Latina[20].

        Estabelecia-se uma nova divisão internacional do trabalho, não mais de oposição nações periféricas (produtos primários) – nações centrais (produtos industrializados). Países como o Brasil eram chamados a exportar bens de consumo industriais (têxteis, calçados etc.) aos países centrais, numa aliança de classe dominantes do centro e da periferia, pois essas exportações contribuíam para baratear a reprodução da força de trabalho no centro e, por outro lado, mantinha-se intacto o monopólio de centro na produção de bens de equipamento, que exigia grandes inversões em pesquisas, inalcançável na periferia. Assim, a dependência se manifestava também por uma estrutura econômica de desequilíbrios setoriais, faltando o departamento de bens de equipamento, situado no exterior. O crescimento da economia brasileira só ocorreria quando a divisão internacional do trabalho favorecesse sua articulação no interior do sistema capitalista mundial[21].

        Apesar das aparentes diferenças, a teoria da dependência era uma extensão da visão cepalina à nova realidade da industrialização brasileira e do regime militar de 1964. Na sua análise, o excedente econômico era transferido para o exterior não apenas pelos mecanismos comerciais, mas pela remessa de lucros e royalties, pagamento dos empréstimos etc.; o acesso à tecnologia de ponta era impossível e o mercado interno estava comprimido, e assim o avanço a novos níveis estava bloqueado. A teoria da dependência permanecia estagnacionista, num novo patamar, o do modelo “semi-industrializado” e articulado mundialmente como subimperialismo[22]. Era como se o Brasil tivesse passado de uma situação estática (país agrícola), por processos não muito claros, para uma nova situação estática (país semi-industrializado), da qual não tinha como sair.

        Os dependentistas foram uma dissidência no seio da intelectualidade de esquerda antes ligada ao modelo Cepal-PCB. Essa dissidência ocorreu em toda a América Latina, como também entre os intelectuais de esquerda do centro do sistema, entre economistas (A.G. Frank), sociólogos (I. Wallerstein), geógrafos (Y. Lacoste) etc. Na América Latina essa dissidência era sobretudo política nas suas motivações e visava refuncionalizar os PC. Partindo da idéia de que não havia condições de crescimento econômico sob o capitalismo, apontava somente duas perspectivas possíveis: fascismo ou socialismo, e, assim sendo, a teoria da dependência funcionou como justificativa às guerrilhas, já que o capitalismo na periferia, como para a Cepal, não tinha futuro[23].

 

3. Os ciclos de acumulação

        Assim como a teoria da Cepal entrou em crise com o golpe militar de 1964, que desvendou as fraquezas desse modelo interpretativo, a teoria da dependência começou a entrar em crise em meados de década de 70, quando a contestação armada ao regime militar foi minguando e o “milagre” econômico comprovou a força do dinamismo industrial brasileiro e o governo Geisel pôs a economia em marcha forçada para a nova substituição de importações, dos insumos básicos e dos bens de equipamentos pesados[24]. Os dados econômicos mundiais, diferentemente das visões estagnacionistas, indicaram o extremo dinamismo da economia brasileira: de 14º PIB do mundo capitalista em 1965 (US$ 19 bilhões), ela ascendeu à condição de oitavo em 1984 (US$ 187 bilhões), registrando um crescimento de dez vezes, somente inferior ao do Japão (treze vezes) no centro do sistema, tendo nesse período ultrapassando Holanda, México, Suécia, Espanha, Austrália e Índia[25].

        Nestas circunstâncias foram sendo retomadas as idéias de I. Rangel, lançadas na década de 50, que constituíram a primeira visão teórica crítica ao modelo cepalino e por isso mesmo tinham que ser ocultadas pela maciça propaganda das idéias da aliança Cepal-PCB, dominantes na época[26]. Rangel destoava ao duvidar que o imperialismo fosse intrínseca e universalmente hostil ao desenvolvimento das forças produtivas nos países dependentes e que o capitalismo nacional fosse necessariamente favorável e apresentava uma teoria do capitalismo contemporâneo e suas especificidades no Brasil, inclusive as articulações de modos de produção a nível nacional e internacional[27], ausente nas formulações cepalinas e empobrecidas nos dependentistas. Assim, para os cepalinos e dependentistas a crise econômica de 1962-67 constituía um “fechamento” do mercado interno e uma crise definitiva do modelo de substituição de importações, quando não passava de uma crise cíclica. Rangel partia da questão capital: por que se desenvolve o Brasil enquanto os cepalinos preferiam se perguntar por que o Brasil estava tão atrasado em relação ao centro do sistema.

        Rangel foi o primeiro a assinalar, seguido mais de perto por P. Singer e F. Oliveira[28], que a industrialização deu origem a um vigoroso modo de produção capitalista no interior da economia agroexportadora com forte setor natural, que desde a década de 20 gerava seus próprios ciclos médios, com fase expansiva seguida de fase recessiva. Tais ciclos levavam à expansão industrial dos investimentos, que se tornam ociosos nos momentos de insuficiência do consumo. A capacidade ociosa recém-instalada constituía poupança potencial, que podia dispensar a poupança externa para a retomada do desenvolvimento econômico no ciclo seguinte. O capitalismo brasileiro estava em condições de se expandir internamente mesmo quando eram desfavoráveis as relações externas, como ficou evidente na década de 30.

        O ponto de partida do esquema explicativo de Rangel foi a constatação de que o sistema mundial capitalista vive fases de expansão e fases de depressão, isto é, cresce em ciclos de longa duração (ou Kondratieff de cinqüenta anos) e os médios (juglarianos de dez anos). Nas fases de expansão dos ciclos longos o centro do sistema tem necessidade de mais matérias-primas, alimentos e mercados consumidores da periferia, tendo interesse em aprofundar a divisão internacional do trabalho, incorporando novos territórios e realizando mais investimentos, tanto no centro como na periferia. Nas fases de depressão dos ciclos longos, diminuindo o ritmo econômico do centro do sistema, vai ocorrendo contração das quantidades e dos preços das matérias-primas e alimentos produzidos na periferia. Como os recursos em uso na periferia estavam voltados em parte ao atendimento do comércio internacional, sob formas de terras, trabalhadores e capitais, eles entravam em ociosidade parcial nessas fases depressivas, forçando a procura de utilizações rentáveis, elevando a economia de alguns países periféricos a se concentrarem na produção de artigos tradicionalmente importados[29].

        Na fase depressiva do primeiro Kondratieff (1815-48), diante da contração do comércio internacional, os fazendeiros passavam a usar parte de suas terras e escravos na produção de subsistência, como no caso dos tecidos grosseiros para uso interno dos latifúndios, assim como na fase depressiva seguinte (1873-96), a substituição de importações adquiriu o caráter de pequena produção mercantil nas oficinas de reparos trabalhadas por “negros de ganho”, que se multiplicaram nas cidades brasileiras e de algumas grandes fábricas de tecidos. Esta industrialização nascente desde 1880 continuou a crescer nas fases de expansão do comércio internacional (1896-1921), pois o Brasil reagia positivamente aos estímulos do centro e também já contava desde os fins do século XIX com tarifas destinadas a atender às necessidades fiscais do Estado brasileiro, que funcionavam como barreiras protecionistas. Assim, é irrelevante, até certo ponto, a discussão acadêmica sobre se a industrialização foi mais rápida com a expansão ou contração do comércio internacional, já que nas duas conjunturas o processo industrial avançou[30].

        À medida que avançava, a industrialização ia gerando um centro dinâmico interno, que na década de 20 já era considerável, pois a indústria, principalmente o ramo têxtil, era o setor mais importante da economia brasileira após o café. Criava-se um setor industrial, que passava a ter seu próprio dinamismo, que se manifestava nos ciclos juglarianos brasileiros. Cada ciclo médio correspondeu a um degrau na escada da substituição de importações: indústria de bens de consumo simples, indústrias de materiais de construção, indústria de bens de consumo duráveis e indústrias químicas e mecânicas pesadas. Isto explica por que a limitação do mercado determinado pela concentração de renda não foi um empecilho, mas até um estímulo à industrialização, tornando desnecessária a reforma agrária, pois os lucros obtidos no setor de bens de consumo simples (têxtil etc.) iam sendo aplicados nas indústrias de materiais de construção, como no caso dos grupos Votorantim, Matarazzo, Jafet, etc., substituindo as novas importações que se faziam. Além disso, a partir da implantação do setor de materiais de construção (cimento, ferro, azulejo etc.), os grupos que se estabeleceram primeiro conseguiram oligopolizar o mercado, dispondo de superlucros crescentemente aplicáveis em novas substituições de importações.

        Na passagem de um ciclo juglariano a outro foram necessárias medidas institucionais que facilitassem as substituições de importações, como o controle do câmbio, o confisco cambial do café, as reservas de mercado, as prioridades às importações de equipamentos não produzidos internamente, os incentivos fiscais e creditícios etc. Evidentemente, o Estado que chegou ao poder em 1930, no qual os industriais foram sócios minoritários, foi indispensável ao bom sucesso deste percurso, e a concentração de rendas, fortemente ligada à ausência de reforma agrária, só passou a ser empecilho atualmente, à medida que o edifício industrial se completou, alcançando o limite final da substituição de importações com a recém-implantada indústria mecânica pesada, tornando necessário um novo pacto de poder e um novo modelo de crescimento econômico-social.

 

 

 

II - Ciclos Longos e Inserção do Brasil na Economia Mundial: Transição para a Economia Industrial

 

Combatendo a teoria das vantagens comparativas do comércio internacional, que apontava os benefícios para a periferia da sua inserção como produtora de bens primários, a CEPAL, na sua análise das relações centro-periferia, insistia na degradação das relações de troca e assim na oposição entre nações periféricas frente às nações do centro do sistema capitalista em conseqüência do bloqueio imposto ao desenvolvimento da periferia. Por sua vez, a teoria da dependência, constatando o avanço da industrialização na periferia, apontava para a existência de uma aliança de interesses das classes dominantes centrais e periféricas e para as oportunidades de avanço da industrialização dependente, capturada pelas multinacionais, nas conjunturas favoráveis da divisão internacional do trabalho (DIT). A teoria dos ciclos econômicos capitalistas (I. Rangel) apontava a possibilidade de expansão capitalista nos países como o Brasil, tanto nas fases de expansão do sistema capitalista mundial e da DIT, como nas fases de contração, tendo em vista a existência de um setor interno industrial, com dinamismo próprio como ficara demonstrado na década de 30[31].

        Para um conhecimento mais correto das relações centro-periferia é necessário considerar os processos de funcionamento do sistema capitalista mundial, em particular os mecanismos de gênese e ação dos ciclos longos (Kondratieff) no interior das economias centrais capitalistas, nas relações centro-periferia em geral, bem como em particular suas conseqüências no comércio internacional e nas possibilidades de reação ativa ou passiva dos diferentes segmentos geográficos e setoriais da periferia às conjunturas internacionais desfavoráveis.

 

1. Os ciclos longos e as relações centro-periferia capitalistas

 

Os ciclos longos na história do capitalismo central

        O sistema capitalista teve origem na Inglaterra no século XVI, com a implantação das manufaturas têxteis de lá e dos arrendamentos capitalistas na agricultura, destinados a criação de carneiros, etc. Antes disso, e paralelamente, os capitais comerciais portugueses e espanhóis haviam lançado as bases das trocas comerciais e das pilhagens coloniais, seguidos pelos capitais comerciais ingleses, holandeses e franceses. Onde a economia capitalista manufatureira e agrícola pouco avançava, como em Portugal e Espanha, os impérios coloniais reforçaram o feudalismo interno e barraram a transição ao capitalismo: o ouro da América deu mais vida ao feudalismo, do que acumulação primitiva ao capitalismo ibérico[32]. Naqueles países nos quais a economia manufatureira já havia avançado, como na Holanda e na Inglaterra, ocorreram revoluções burguesas precoces, nos séculos XVI e XVII respectivamente, tornando os impérios coloniais bases da acumulação primitiva capitalista, onde as trocas e pilhagens favoreciam a expansão da manufatura e não a sobrevivência do feudalismo nas metrópoles. Assim, não se deve tomar ao pé da letra a afirmação de que era a supremacia comercial que dava margem, na época, à supremacia manufatureira[33]. Não há dúvida, entretanto, que a expansão das manufaturas, nascentes na Inglaterra acopladas ao mercado interno, exigiam a conquista de novos mercados e assim expansão comercial, conquistada de novas colônias. Os séculos XVI e XVII foram por excelência o período áureo do capital comercial europeu, responsável pela nascente "Economia-mundo européia"[34], na qual ocorreram diferentes graus de integração com a periferia em formação: as áreas de "plantations" escravistas no Brasil, Antilhas e Sul dos EUA foram as mais integradas, seguidas da Europa Oriental (Prússia, Polônia, Hungria etc.) e América Espanhola, onde dominou o trabalho servil, reforçada no primeiro caso, a chamada segunda servidão, ou por substituição dos modos de produção asiáticos existentes anteriormente entre os astecas, incas e maias. As economias tribais africanas, que forneciam os escravos para a América, as economias asiáticas auto-suficientes da Índia e da China, abastecedora, de artigos de luxo e as áreas de pequena produção mercantil da Nova Inglaterra e do Canadá mantiveram relações menos intensas com o capital comercial europeu.

        A articulação entre o centro e a periferia era realizada pelo capital comercial europeu e assim as formações sócio-espaciais periféricas eram compostas de dois setores: o capital mercantil europeu presente na colônia e na metrópole e as estruturas produtivas internas que sozinhas não conseguiam definir um modo de produção. Na verdade, a escravidão brasileira ou a servidão na América espanhola eram mais complexas do que a escravidão romana antiga ou o feudalismo europeu, pois não eram puras e sim criações simultâneas do capital comercial europeu, que obtinha super-lucros exportando aos preços mais altos e importando os preços mais baixos e para isto impunha na periferia relações de trabalho compulsórias. No processo de emersão do capitalismo foram nascendo formações sociais duais na periferia (capital comercial mais trabalho compulsório), na expressão de I. Rangel, que não podiam ser entendidas na estrita extensão do território colonial, como a escravidão no Brasil, que consistiu numa articulação que abrangia a produção de mercadorias e subsistências no Brasil, a reprodução da força de trabalho na África e a acumulação de capital principalmente na Europa ocidental[35].

        A economia-mundo européia foi sujeita às oscilações cíclicas de longa duração, que consistiram num movimento secular, com uma fase de grande expansão no século XVI e outra fase depressiva no século XVII. A fase expansiva correspondeu à implantação das manufaturas na Inglaterra e Holanda e às descobertas marítimas e coloniais sobretudo portuguesas e espanholas. A manufatura consistia num sistema avançado de organização do trabalho, com sua divisão interna, mas era tecnicamente conservadora, na medida em que era artesanal[36]. Uma vez implantado, o sistema se expandia horizontalmente, sem maiores renovações técnicas de capital intensivo. Provavelmente por esta razão o século XVII foi marcado pela baixa conjuntura, pois o sistema manufatureiro não podia sofrer alterações verticais, além de que os territórios coloniais conquistados no século XVI não foram ampliados e as guerras comerciais se restringiram mais a disputá-los[37].

        Durante o século XVII a depressão econômica que se manifestou na Europa, exceção da Holanda, provocou grande diminuição do comércio colonial e assim queda da produção dos gêneros coloniais, principalmente no período 1620-1670. A periferia, aparentemente, permaneceria deprimida, mas os acontecimentos históricos mostraram que na Índia, no Brasil, nas colônias americanas da Espanha e mesmo num país então semi-periférico como Portugal, haviam potenciais disponíveis à expansão de produções destinadas aos mercados internos, até então abastecidos pelo capital mercantil europeu.

        Na Índia houve forte crescimento das manufaturas têxteis, que provocou conjuntura econômica favorável ao comércio, à agricultura, etc. No Brasil e na América espanhola desenvolveram-se a pecuária e a agricultura destinadas ao abastecimento interno e nas cidades do México, Peru, Chile, etc. desenvolveram-se manufaturas de tecidos de algodão e lã, grandes (obrajes) e pequenas (trapiches), manufaturas reais de cigarros e pólvoras, fábricas de louças e chapéus, etc. que floresceram exatamente nas conjunturas de depressão do comércio colonial nos séculos XVII e XVIII[38]. A mesma relação entre depressões comerciais e arranques industriais ocorreu em Portugal, onde a queda dos preços do açúcar, tabaco, cravo, etc. acabou provocando no período 1670-1690 o primeiro impulso industrialista, de tipo colbertiano, interrompido com a elevação dos preços dos gêneros coloniais nos fins do século XVII. Nos séculos seguintes, depressões comerciais continuaram a estimular reações industrializantes em Portugal[39].

        O período mercantilista e manufatureiro do capitalismo apresentou fases de expansões e depressões comerciais, além de ter estimulado na periferia 1) relações de produção que se subordinavam ao capital comercial europeu e 2) o desenvolvimento das forças produtivas mesmo nas fases de depressões comerciais, inclusive na semiperiferia ibérica. O que se passou no período industrial do capitalismo?

 

Comércio internacional e modos de produção no Brasil

        Os contemporâneos da grande depressão da segunda metade do século XIX (1873-1896), como F. Engels, haviam percebido a existência de um período prolongado de contração econômica, mas somente os estudos de estatística econômica de N. Kondratieff, publicados em 1926, demonstraram a evidência empírica dos ciclos longos, nos quais se alternavam fases de expansão e fases de depressão econômicas[40]. Assim, desde a primeira revolução industrial sucederam-se quatro ciclos longos, com um primeiro período expansivo (a) e um segundo depressivo (b), totalizando cinqüenta anos cada um, aproximadamente, como se segue:

 

 

(a)

(b)

1° ciclo longo de Kondratieff

1790-1815

1815-1848

2º ciclo longo ou Kondratieff

1848-1873

1873-1896

3º ciclo longo ou Kondratieff

l896-1920

1920-1948

4º ciclo longo ou Kondratieff

1948-1973

1973-1996(?)

 

Os ciclos longos desempenharam e continuam desempenhando papel fundamental no funcionamento do sistema capitalista. A fase expansiva do primeiro ciclo longo (1790-1815) correspondeu ao auge da primeira revolução industrial (Inglaterra), ponto de partida dos ciclos industriais longos (Kondratieff) e médios (Juglar) e do capitalismo concorrencial, que se estendeu historicamente pelos dois primeiros ciclos longos (1790-1896). Na fase depressiva do segundo ciclo longo (1873-1896) aceleraram-se as mutações que transformaram o capitalismo concorrencial em monopolista e imperialista, bem como foram lançadas as bases da segunda revolução industrial (EUA e Alemanha), O capitalismo monopolista tem correspondido ao terceiro e quarto ciclos e mesmo o planejamento keinesiano, vigente desde a década de 30 no centro do sistema, não impediu a eclosão de nova fase depressiva, iniciada em 1973, durante a qual parecem estar em gestação as inovações técnicas e outras mudanças que permitem pensar numa terceira revolução industrial, que deverá se abrir na década de 90 (Japão?). Estas rápidas observações levam a concluir que os ciclos longos fazem parte do cerne do capitalismo e de sua periodização[41].

        O capitalismo tem funcionado à base de longas fases de investimentos crescentes, expansão e euforia, como no após segunda-guerra mundial e de fases de queda do nível dos investimentos, depressão e pessimismo, como está acontecendo desde 1973. Como explicar esta alternância sucessiva de expansão-depressão? Ao introduzir a máquina-a-vapor, a revolução industrial inglesa permitiu a elevação da taxa de lucro e provocou o rápido desaparecimento das manufaturas e artesanatos na Inglaterra. Mas à medida em que esta inovação foi entrando em todos os ramos industriais, ela foi esgotando paulatinamente as áreas carentes de investimentos e baixando a taxa média do lucro, criando uma situação desinteressante ao capital e abrindo, assim, um período depressivo (1815-1848). Ao se esgotarem as possibilidades de avanço da máquina-a-vapor no setor industrial, o capitalismo inglês adotou duas alternativas: 1) expansão do comércio internacional, com a crescente penetração de seus tecidos em novos mercados, sucessivamente Índia colonial, América recém-independente e China após a guerra do Ópio (1842), cujos artesanatos e manufaturas foram sendo destruídos e 2) estímulos às invenções que permitissem a aplicação da máquina-a-vapor aos meios de transporte continentais e oceânicos, que haviam se mantido "manufatureiros". Enquanto a primeira opção correspondia a uma acumulação extensiva, horizontal e geográfica, a segunda era uma opção que provocou logo depois acumulação intensiva e vertical, rejuvenescendo e dinamizando a Inglaterra quando foi posta em pratica maciçamente, abrindo nova fase expansiva do capitalismo (1848-1873), baseada na utilização crescente dos trens e navios-a-vapor em todos os quadrantes do mundo[42].

        Passada a grande fase de investimentos na modernização dos transportes, que permitindo baratear seus custos deu novo impulso à divisão internacional do trabalho patrocinada pela indústria inglesa, os negócios voltaram a se contrair no período 1873-1896, fase depressiva do 2° Kondratieff. Nesta fase as fusões industriais se aceleraram na Inglaterra e o capital industrial foi penetrando no setor bancário, resultando no capitalismo monopolista e financeiro. Diante da queda do comércio internacional, o poder militar inglês se encarregou de abrir novos mercados na África e na Ásia, lançando as bases da etapa imperialista do capitalismo, como parte do processo de acumulação extensiva e horizontal. A Inglaterra não reagiu à depressão de 1873-1896 de maneira dinâmica, diferentemente dos EUA e Alemanha, até então atrasados, que foram os lugares onde ocorreram as invenções que permitiram a eclosão da segunda revolução industrial (linha de montagem, eletricidade, química etc.), no final do século XIX e inícios do século XX[43].

 

Ciclos longos e reações econômicas no Brasil

        As relações centro-periferia criadas pelo capital comercial no século XVI e reforçadas pela manufatura capitalista que sustentaram uma grande variedade de trabalhos compulsórios na periferia, intensificaram-se no século XIX com o crescimento do capitalismo industrial inglês, responsável pela passagem dos modos de produção escravistas e asiáticos periféricos aos modos de produção feudais periféricos[44].

        Nas fases expansivas dos ciclos longos (1790-1815 e 1848-1873), os investimentos no centro como na periferia cresciam. A expansão da Inglaterra determinava maiores aquisições de matérias-primas e alimentos da periferia, que sofria extroversão em decorrência de um crescimento proporcionalmente maior do comércio internacional em relação à economia. Nas fases depressivas dos ciclos longos emanados do centro (1815-1848 e 1873-1896), as compras de matérias-primas e alimentos da periferia decresciam bem como os preços, ocorrendo contração da DIT mais do que proporcional à economia, grande ociosidade de capital-dinheiro, terras e força de trabalho voltados à produção exportadora, provocando tendências desiguais à estagnação ou ao crescimento para dentro, pela via de substituição de importações[45]. O comércio internacional acompanhou rigorosamente os ciclos longos como se pode perceber nos dados de W.W. Rostow[46], que calculou suas taxas anuais médias de crescimento por, períodos: 1860-70 (5,5%), 1870-1900 (3,2%), 1900-13 (3,7%), 1913-29 (0,7%), 1929-38 (-1,15%) 1938-48 (0,0%), 1948-71 (7,3%), com avanço ou recuo da DIT nas fases expansivas e depressivas da economia mundial respectivamente.

        Os dados organizados por H. Bruit[47], referentes ao comercio exterior de cinco países latino-americanos no período 1850-1914, confirmam as tendências de abertura e fechamento das economias nacionais ao comércio internacional, mas servem para distinguir dois tipos de reações diferentes. Brasil, México e Colômbia caracterizavam-se por uma inserção moderada na DIT durante o período: o comércio exterior por habitante, apesar de variar conforme os estímulos emanados do centro do sistema, não se ampliou nitidamente. Assim, o Brasil partiu de menos de £4 (1850-54), tendo atingido pouco mais de £6 em 1870-74 e 1880-84, caindo para £3 em 1900-04 e não alcançando £5 em 1910-14. Já a Argentina e Chile apresentaram crescente inserção na DIT: a Argentina partiu de £5,5 em 1860-64 e apesar das leves oscilações cíclicas, ultrapassou £20 em 1910-14. A Argentina e o Chile, em decorrência da crescente demanda internacional de trigo, carnes e lã no primeiro caso e de nitratos no segundo caso, se abriram fortemente à DIT no século XIX, enquanto Brasil, México e Colômbia continuavam a desenvolver na mesma época economias voltadas ao mercado interno nos períodos de depressão externa (Gráfico 1).

        I. Rangel[48] foi o primeiro a relacionar a estrutura e evolução da formação social brasileira aos modos de produção dominantes no centro do sistema. O escravismo como criação do capital comercial europeu, nas condições específicas das forças existentes em certas áreas da periferia, estava maduro para assumir o poder no Brasil durante o período depressivo do 1° Kondratieff (1822), em sociedade com o capital comercial brasileiro, que se havia formado nas principais praças portuárias. (Rio, Recife, Salvador, etc.), ao longo do período colonial, como dissidência do capital comercial português. Esta aliança de classes dominantes brasileiras havia rompido sua subordinação ao capital comercial da metrópole portuguesa e passava a se relacionar com o capital industrial inglês, ao redor do qual passou a girar de 1808 a 1930. No período depressivo de 2° Kondratieff (1876-96) ocorreu outro reajuste de classes dominantes e do pacto de poder interno: os senhores de escravos cederam a hegemonia e se transformaram em senhores de terras, como dirigentes subalternos. No período depressivo do 3° Kondratieff (1930), os senhores de terras assumiram a hegemonia, aliados aos industriais dissidentes do capital comercial interno e substituíram a dependência ao capital industrial inglês pela subordinação ao capital financeiro norte-americano, mais dinâmico.

        As relações sociais no interior da formação social brasileira alcançaram graus de maior tensão nos períodos depressivos dos ciclos longos, como as lutas regionalistas que sacudiram o Brasil durante o período regencial (Balaiada, Cabanada, Farrapos, etc.), as rebeliões que antecederam a Abolição – República, o Tenentismo das décadas de 1920-30, que conduziram à reformulação dos pactos de poder dominantes[49]. Por outro lado, tais pactos, envolvendo igualmente as forças sociais dominantes no centro do sistema, apesar de vigentes em toda a periferia, tiveram suas especificidades em cada formação social nacional: a revolução de 1930 no Brasil apeou do poder os setores agro-exportadores, que na Argentina, na mesma época, tiveram seu poder reforçado, com conseqüências desiguais no processo de substituição de importações[50].

        Os pactos de poder se fizeram acompanhar da luta pela hegemonia das idéias econômicas. A política inglesa de ampliação do comércio internacional encontrou defensores na América Latina de após-independência: os chamados "liberais", como o visconde de Cairu e Jovellanos, mas a conjuntura depressivo de 1815-1848 favoreceu a defesa das idéias chamadas "conservadoras", de intervenção do Estado, protecionismo e defesa da mercando interno. Com o avanço da DIT após 1848, os "liberais", apoiados pela Inglaterra tornaram-se vitoriosos e tomaram medidas de abertura, em prol do livre-comércio[51].

        O século XIX apresentou duas fases depressivas prolongadas (1815-48 e 1873-96), durante as quais as reações à penetração das mercadorias inglesas variaram conforme os pactos de poder existentes na periferia. Assim, comparando os exemplos da Índia Britânica, Brasil e México, percebemos que por volta de 1820-30 as tarifas de importações mais baixas eram cobradas na Índia (3% ad-valorem), seguidas pelas brasileiras (15%) e as mais altas eram as do México, que alcançavam 40%[52]. Certamente estas taxas diferentes relacionavam-se com a falta de autonomia política da Índia Colonial, a independência brasileira realizada sob proteção inglesa e o processo de lutas intensas que provocaram a independência do México. Assim, nesse período, teve seqüência a invasão de tecidos ingleses na Índia Colonial, no Brasil e no México, mas na periferia latino-americana houve uso das capacidades ociosas criadas na depressão de 1815-48. No México, por exemplo, o governo independente tornou-se protecionista e industrialista. Sob a liderança do ministro L. Alamán não só manteve altas as tarifas de importação, como criou o Banco de Avio, responsável pelo financiamento de várias fábricas têxteis modernas implantadas neste período[53]. A reação brasileira foi mais modesta, em vista dos compromissos assumidos pelo Estado no processo de independência, mas eficiente. A ociosidade de terras e braços antes voltados à exportação foi canalizada à produção de alimentos e matérias-primas e à produção de tecidos, móveis, roupas, etc. que realizavam uma substituição de importações no interior das fazendas escravistas. O capital comercial brasileiro, que também se tornou ocioso, deu origem aos primeiros bancos comerciais privados de 1838 a 1847 no Rio, Salvador, São Luiz, Belém e Recife, além de que o enfraquecimento das finanças públicas em conseqüência da queda das receitas cambiais, levou o Estado brasileiro a baixar em 1844 as primeiras tarifas fiscais e protecionistas de nossa história[54].

        O avanço da DIT nos anos 1848-73 provocou nova extroversão nas economias periféricas e o enfraquecimento dos setores ligados à substituição de importações realizadas anteriormente: no México as tarifas foram afrouxadas a partir de 1856 e no Brasil a partir de 1857, provocando desindustrialização entre nós, que se manifestou, por exemplo, no fechamento do estaleiro naval do Barão de Mauá[55]. Na verdade, ao longo de todo o século XIX as tarifas de importação variaram na Europa Continental como também na periferia em vista das expansões e depressões da economia industrial inglesa, baixando e subindo respectivamente, num movimento inverso[56].

 

2. Ciclos longos, substituição de importações e industrialização brasileira

        A industrialização brasileira nasceu sob o signo das relações mundiais de nossa economia, ao influxo dos ciclos emanados do centro do sistema capitalista, tendo adquirido um impulso extraordinário desde a revolução de 1930, em conjuntura de forte contração do comércio internacional, continuando seu avanço rápido no após-guerra, mesmo com a recuperação do sistema mundial capitalista.

 

Da substituição natural à substituição industrial

        Assinalamos, anteriormente, que a relação entre conjunturas mundiais favoráveis e desfavoráveis à DIT e atividades econômicas no Brasil constituíram um dado básico de nossa história[57]. Assim, quando a produção açucareira no Brasil nos fins do século XVII e inícios do XVIII sofreu forte contração causada pela concorrência das Antilhas, houve uma reação dinâmica no interior dos engenhos, visando manter elevado o nível das atividades, usando a capacidade instalada que se tornava ociosa. Benci em 1700 e Antonil em 1711 constataram que os senhores de engenho do Nordeste para fazer face à crise, punham a disposição de seus escravos pequenos lotes de terras e um dia da semana destinados aos cultivos de subsistência, dando origem ao que se pode chamar de "brecha camponesa" no escravismo colonial[58].

        Igualmente, quando se iniciou a partir de meados do século XVIII a fase de decadência da extração do ouro em Minas Gerais, ocorreu um sólido processo de substituição de importações, que foi dando origem à "fazenda mineira", caracterizada por uma policultura agrária extremamente variada, além de forte auto-suficiência artesanal. Por isto mesmo o Marquês do Lavradio, em 1779, salientava "a independência com que os povos de Minas se tinham posto dos gêneros da Europa, estabelecendo a maior parte dos particulares, nas suas próprias fazendas, fábricas e teares, com que se vestiam a si e à sua família e escravatura, fazendo panos e estopa e diferentes outras drogas de linho e algodão, e ainda de lã"[59]. Este mesmo processo ocorreu em menores proporções nas áreas de mineração de Mato Grosso e Goiás, como assinalaram os viajantes estrangeiros, permitindo o aparecimento de um setor de subsistência muito diversificado, em diferentes regiões brasileiras, que está na raiz do que M. Santos chama de "circuito inferior da economia"[60].

        Mas foi somente com o capitalismo industrial dominante no centro do sistema capitalista, que os ciclos longos se manifestaram e de maneira muito vigorosa nas relações centro-periferia. Se a conjuntura ascendente de 1790-1815 havia contribuído à diversificação e ampliação das exportações brasileiras (algodão e couros sobretudo), o período de baixa conjuntura internacional que vai de 1815 a 1848 provocou no Brasil uma generalizada substituição de importações, que se repetiu, ainda no século XIX, na baixa conjuntura de l873-1896, como já se assinalou[61].

        No processo que deu origem à independência brasileira manifestaram-se duas tendências econômicas contraditórias referentes à industrialização: a intenção industrializante da coroa portuguesa, baseada na experiência pombalina e consubstanciada no alvará de 28 de abril de 1809 e a subordinação do comércio importador aos interesses do capital industrial inglês, conforme o tratado de 19 de fevereiro de 1810, que conferiu às manufaturas inglesas tarifa preferencial de 15%[62]. Da coexistência destas duas linhas resultaram algumas, iniciativas estatais e privadas, que deram origem à implantação de algumas indústrias e manufaturas, nos ramos siderúrgico, têxtil etc., que tiveram poucos anos de vida, pois não suportaram a concorrência dos produtos ingleses[63].

        A queda do comércio exterior brasileiro no período 1821-30 a 1841-50 de £1,95/habitante/ano a £1,64[64], foi provocando séria crise nas finanças do Estado, além de sentimentos nacionalistas e protecionistas. Assim, com o encerramento da vigência do tratado de 1810, acabou sendo decretada em 1844 a tarifa Alves Branco que visava "não só preencher o déficit do Estado, como também proteger os capitais nacionais já empregados dentro do país em alguma indústria fabril, e animar outros a procurarem igual destino", elevando as taxas sobre os tecidos importados a 30%. Além disto, as fábricas de tecidos foram beneficiadas em 1846-47 por vantagens fiscais[65]. Em 1844 existiam no Brasil quatro fábricas de tecidos de algodão, três nascidas na Bahia em 1834, 1835 e 1844 e uma no Rio de Janeiro, nascida em 1840. Até 1857-60, quando a política tarifária brasileira sofreu liberação, surgiram mais sete, sendo três na Bahia e as demais em Alagoas, Minas, Rio e São Paulo[66].

        A contração do comércio mundial no primeiro ciclo Kondratieff permitiu aplicação de capital-dinheiro dos comerciantes das praças portuárias brasileiras em atividades bancárias[67] e em algumas indústrias de tecidos de algodão, as quais, entretanto, não podiam realizar uma significativa substituição de importações diante da vigorosa concorrência inglesa. O principal esforço de substituição de importações naquela conjuntura foi a diversificação das atividades produtivas no interior da fazenda de escravos, numa "economia natural onde o poder de competição da indústria capitalista do centro dinâmico chegava mais enfraquecido do que se limitado por uma forte tarifa aduaneira[68].

        A queda do comércio exterior no período 1821-1850, acima assinalada, evidenciou-se nos seguintes dados: para uma população de quatro milhões de habitantes em 1821, o Brasil importava £4,57 milhões, enquanto em 1848-50 quando a população havia alcançado sete e meio milhões importávamos £ 6,38 milhões, o que obrigava a ampliar a economia natural para atender a queda das importações. Na verdade, esta economia natural no interior das fazendas já vinha do período colonial, incluindo os tecidos grossos destinados ao vestuário dos negros e a enfardar gêneros agrícolas[69] e foi ampliada neste período, visando substituir as importações em declínio.

        O artesanato doméstico rural esteve difundido por todo o território brasileiro durante o período colonial, conforme assinalou S. Buarque de Holanda e observaram os viajantes estrangeiros que percorreram o Brasil no início do século XIX, em pontos tão distantes como o interior de São Paulo, a ilha de Santa Catarina ou os arredores de Cuiabá[70]. Entretanto, Minas Gerais foi, provavelmente, a área na qual os artesanatos mais se estenderam e se aprofundaram, desde a produção das necessidades de consumo comuns e de luxo, até a produção de utensílios para o trabalho agrícola[71].

        Em Minas Gerais desde o século XVIII até as primeiras décadas do XX "foi tão generalizada a plantação de algodoeiro, que em cada fazenda havia teares para o fabrica de tecidos grosseiros". A maior parte da produção de tecidos de algodão era constituída de panos grosseiros para escravos e pobres, mas também se produziam tecidos finos usados na "Confecção de roupas masculinas e roupas de baixo, além das conhecidas toalhas de mesa, lençóis e colchas, que rivalizavam com as mais finas importações". Em 1827-28 produziam-se em Minas 7,4 milhões de metros de tecidos de algodão, que representavam quase 20% das importações brasileiras de tecidos de algodão inglês, sendo que 30% da produção mineira era exportada, principalmente ao Rio de Janeiro. O avanço do DIT após 1850 estimulou as fazendas a se especializarem na produção para exportação, absorvendo mão-de-obra da produção natural e criando mercado para os tecidos industriais, importados ou produzidos internamente. Assim, em 1869 o presidente da província lamentava que "a indústria manufatureira já prosperou na Província mais do que hoje, e tende a decair cada vez mais, com a concorrência dos produtos estrangeiros mais perfeitos e menos custosos, que a facilidade das vias de comunicação vai introduzindo na província". Em 1872 Minas Gerais reunia 55% dos 139 mil trabalhadores em tecidos recenseados no Brasil, mas as exportações dos "panos de Minas", tão fortes durante a primeira metade do século XIX, declinaram a partir de 1875 e desapareceram nos últimas anos do século[72].

        Quanto à siderurgia, mesmo antes da independência o Estado financiou a implantação de altos fornos no início do século XIX, em São Paulo e Minas, mas que não tiveram sucesso. Como assinalou Eschwege, além de outras dificuldades, o mercado consumidor, pelo menos no caso de Minas Gerais, estava atendido pelas inúmeras forjas existentes na zona central da província, em todas as grandes fazendas, produzindo ferro em cadinhos, transformado em ferraduras de animais, peças de engenho, ferramentas agrícolas etc. Em 1853, segundo J. Monlevade, existiam 84 forjas naquela zona, em 1883 foram relacionadas 75 e em 1894 haviam 55, das quais 6 pequenas usinas fundadas após 1888. Como o artesanato têxtil doméstico, a sobrevivência foi prolongada, mas com as novas condições do comércio mundial as forjas primitivas foram cedendo lugar às usinas, a primeira das quais, a usina Esperança, foi implantada em 1888[73].

        A contração da economia mundial capitalista, que estimulou a auto-suficiência da fazenda escravista no Brasil, teve fim em 1848-50, e a partir daí a utilização maciça de transporte ferroviário e da navegação a vapor em todo o planeta garantiu grandes investimentos e incentivou a periferia a produzir mais gêneros de exportação. A economia brasileira voltou a se inserir na DIT, desestimulando a produção natural nas fazendas, que passou a declinar. O comércio exterior brasileiro, que havia sido de £ 1,64/habitante/ano no período 1841-50, o mais baixo do século XIX, alcançou £3,40 no período 1871-80, garantindo lucratividade às atividades de exportação e estimulando as importações inglesa[74]. Como já apontamos anteriormente, se a conjuntura de contração do comércio mundial havia favorecido o estabelecimento de tarifas protecionistas em 1844, a sua expansão a partir de 1848-50 contribuiu para a redução das tarifas aduaneiras em 1857 e 1860 e reintrodução de nova fase de livre-comércio, dificultando a existência das poucas "fábricas nacionais", surgidas na conjuntura anterior. Por outro lado, a reinserção do Brasil na DIT, propiciando recursos monetários aos fazendeiros, levou-os a abandonar suas casas-grandes, onde se realizavam os artesanatos de auto-consumo, e a se instalarem nas cidades, dando impulso à urbanização brasileira após 1850[75].

        Esta urbanização de após 1850 acentuou uma das características das cidades brasileiras, a de cidades de fazendeiros, que aliás nelas se instalaram com sua numerosa criadagem escrava liberada das casas-grandes. A partir de 1873, excetuando o café, cujo preço caiu mais tarde, os produtos de exportação brasileiros acusavam queda no preço obtido no mercado, provocando o declínio da renda monetária e empobrecimento da aristocracia rural recém urbanizada. Assim, essa população escrava foi sendo lançada ao mercado urbano de trabalho, alugados ou como "negros de ganho"[76], em profissões que freqüentemente contribuíam para substituir importações, como carpinteiros, pedreiros, gráficos mecânicos e muitas vezes agrupados espacialmente como rua Ferradores (atual rua da Alfândega) ou a Praia dos Sapateiros (Praia do Flamengo), além de constituírem parte significativa da mão-de-obra especializada das manufaturas de chapéus e outras do Rio de Janeiro. Assim como a "brecha camponesa" das primeiras crises da economia exportadora escravista, o "negro de ganho" foi também uma brecha, inserido na pequena produção mercantil urbana nas últimas décadas de escravidão[77].

        Além da substituição de importações urbanas artesanais e manufatureiras usando mão-de-obra escrava e livre, ocorreu também uma substituição natural no interior das fazendas, mais modesta que anteriormente, e começou a se generalizar, principalmente pela aplicação dos capitais comerciais, que cresceram rigorosamente de 1850 a 1873, mas que se tornavam ociosos desde então, uma substituição industrial de importações no setor têxtil, desde o Maranhão até o Rio Grande do Sul, beneficiada pelas tarifas ascendentes de 1879. Note-se que esta substituição industrial, modesta inicialmente, passou a desempenhar papel central na economia brasileira após 1930[78].

 

Os principais ramos industriais no início do século XX

        Quais os ramos industriais que se desenvolveram no Brasil até as primeiras décadas do século XX? As produções industriais mais avançadas eram as de alimentos, têxteis e vestuário. Alguns destes setores já eram claramente industriais: tecidos de algodão, lã e juta, além da produção de açúcar, fósforos e cerveja, enquanto outros permaneciam ainda com características manufatureiras e mesmo artesanais, como as produções de calçados, chapéus, cigarros e charutos, móveis, banhas, charque, além dos curtumes e oficinas mecânicas e fundições. A produção de tecidos de algodão, entretanto, era de longe a mais importante.

        Assim como na Inglaterra do século XVIII, o ramo têxtil foi o primeiro a se tornar industrial, mas sem passar pela longa fase manufatureira, saltando rapidamente da fase artesanal à industrial. Esta passagem ganhou impulso a partir de 1865-70, visando atender às necessidades das fazendas, que se especializavam nos gêneros de exportação e abandonavam a produção artesanal de auto-consumo. Assim, por exemplo, em Minas Gerais (Sete Lagoas), na fazenda de A.G. Mascarenhas, em meados do século XIX, havia 12 teares manuais operados por escravos, produzindo tecidos de algodão para ensacar gêneros agrícolas e vestir os escravos, além de alguma sobra para vender. Seus filhos, que haviam exercido atividades comerciais lucrativas (sal) instalaram 18 teares mecânicos importados dos Estados-Unidos, acionados por força hidráulica, supervisionados por técnico americano, e com forra de trabalho, matérias-primas e mercado consumidor das redondezas, que começaram a produzir em 1872. O mesmo processo acima referido, iniciado na Bahia, começava a se generalizar por todo o território brasileiro[79].

        Tendo começado com estabelecimentos de pequeno porte no período 1840-1870, substituindo a produção artesanal das fazendas reinseridas na DIT, a produção industrial de tecidos de algodão iniciava sua concorrência aos produtos importados nas duas últimas décadas do século XIX. Deste modo, em 1907 já controlava 67% do mercado interno e atingia 81% em 1913, acelerando o processo. Assim sendo, na última data não só era nitidamente o mais importante segmento industrial brasileiro, como era o 10º parque têxtil no mundo, ocupando 50 mil teares[80].

        Além da indústria têxtil, onde predominava a produção de tecido de algodão, o ramo alimentar teve grande significação no início do século XX. Apresentava-se também bastante disperso geograficamente e muito diversificado quanto aos sub-ramos. Certos segmentos ainda mantinham características fortemente manufatureiras, como os estabelecimentos produtores de banha de porco e sobretudo as charqueadas, muito numerosas no Rio Grande do Sul, onde as maiores unidades empregavam centenas de trabalhadores. Durante a primeira guerra mundial, a partir de incentivos governamentais, implantavam-se matadouros-frigoríficos, principalmente em São Paulo, usando técnicas modernas e voltados conjunturalmente às exportações (33 mil toneladas em 1918), que acabaram sendo controlados por capitais norte-americanos e ingleses. No ramo alimentar houve avanço das usinas de açúcar, no Nordeste e no Estado do Rio de Janeiro, que acabaram absorvendo grande número de engenhos, numa modernização sem mudanças sociais[81]. Também no final do século XIX e início do XX, cresceram produções tipicamente artesanais e manufatureiras de substituição de importações, que aliás já se haviam completado em setores como cervejas, chocolates, massas alimentícias, etc., sendo que o primeiro dos citados se tornava rapidamente industrial (Brahma – Rio de Janeiro e Antártica – São Paulo, que tinham 700 e 362 empregados, respectivamente, em 1907).

        Igualmente dispersos nas maiores cidades brasileiras apareciam outros setores "industriais", que aparecem eram muito precocemente no processo de substituição de importações da primeira metade do século XIX, como artesanatos que se tornaram manufaturas e que cresceram durante o período de substituição de importações do 2° Kondratieff (1873-1896), usando parcela considerável de mão-de-obra escrava especializada (negros de aluguel), além de trabalhadores urbanos livres, muito dos quais imigrantes estrangeiros recém-chegados. Em 1907, estes setores, já em parte transformados em industriais, controlavam o mercado interno em altas proporções: charutos e cigarros (100%), calçados (95%), chapéus (90%), móveis (90%), etc.[82].

        Se as indústrias das primeiras décadas do século XX eram claramente ramos de consumo popular, como fica claro na relação do Censo Industrial – 1907, é importante chamar a atenção para o caráter precoce de algumas produções industriais de equipamento. Já assinalamos que elas existiam durante o século XIX no interior do complexo rural brasileiro. Mas nas grandes cidades elas apareceram muito cedo, como oficinas mecânicas e fundições para atender as necessidades de conserto das máquinas das usinas-de-açúcar (Recife), das fazendas de café (São Paulo e Campinas), dos navios a vapor (Rio de Janeiro), etc.[83]

 

Gênese dos capitais e localização industrial na primeira fase

        O primeiro grande segmento industrial brasileiro foi constituído pelas fábricas de tecidos de algodão, que surgiram inicialmente na Bahia, onde funcionaram 11 dos 30 estabelecimentos existentes no Brasil em 1875[84]. Em fins do século XIX a cidade do Rio de Janeiro ocupava a primeiro lugar não só no ramo têxtil, mas em geral: em 1907 contribuiu com 33,1% da produção industrial brasileira, quando todo o Estado de São Paulo participou com apenas 16,5%. Entretanto, durante a primeira guerra mundial, São Paulo assumiu a liderança, que foi sendo cada vez mais ampliada. Como explicar estas mudanças?

        As primeiras iniciativas industriais na Bahia foram tomadas pelos grandes comerciantes portugueses[85], antes mesmo de 1850 e estiveram ligadas à grande contração das atividades agrícolas de exportação da primeira metade do século XIX, que atingiu mais agudamente esta antiga região açucareira, provocando grande ociosidade de terras e braços, que explica o surgimento precoce no Recôncavo de um campesinato recém-liberto (policultura e fumo no século XIX) e consequentemente grande ociosidade do capital comercial, que procurou caminho nas indústrias de substituição de importações de tecidos populares e sacos de algodão de uso regional. No caso do Rio de Janeiro, a indústria têxtil também surgiu cedo, mas seu grande impulso data da década de 1870-80, com transferência de capitais do comércio importador. Aqui, novamente, os capitais comerciais foram se tornando ociosos com a contração do centro do sistema capitalista após 1873 e como eles eram os maiores importadores e atacadistas de tecidos do Brasil (A. Vizeu, Sotto Maior, D. Bebiano, etc.), acabaram dando origem às maiores fábricas de tecidos nacionais da época, como a América Fabril, metropolitana, etc.[86]. O mesmo processo ocorreu nas praças comerciais do Nordeste, como assinalaram M. C. Pereira de Melo e D.M. Passos Sobrinho, estudando o Maranhão e Sergipe, respectivamente[87].

        As primeiras iniciativas industriais em São Paulo foram tomadas pela aristocracia rural. As seis primeiras tecelagens paulistas começaram a funcionar entre 1870 e 1876, não longe das áreas algodoeiras. A expansão da lavoura de café ia absorvendo mão-de-obra escrava dos setores de auto-consumo das fazendas, dispensando a produção no complexo rural dos tecidos artesanatos destinados a vestir seus escravos. Assim, foram frutificando as iniciativas industriais dos fazendeiros de algodão (A. Paes de Barros, D.P. Souza Arouca, etc.) ou de café (Souza Queiroz, etc.) que importavam equipamentos e técnicos europeus ou norte-americanos e tinham como mercado consumidor os trabalhadores escravos das fazendas de café[88].

        Entretanto, a medida em que as fazendas de café paulistas se expandiam, eram forçadas a absorver, sobretudo nas frentes pioneiras, colonos imigrantes estrangeiros, que tendo em conta a escassez de força de trabalho nessas regiões, obtinham o direito de realizar cultivos intercalares de cereais (arroz, feijão, milho, etc.), como pequenos produtores independentes, além dos salários referentes aos cafezais. Estas relações de trabalho permitiram uma distribuição de rendas tal que dava margem a uma pequena acumulação por parte desses colonos e o surgimento nas cidades vizinhas de uma pequena produção mercantil destinada a atender suas necessidades, que constituiu o ponto de partida de numerosas pequenas indústrias paulistas em Limeira (máquinas agrícolas), Franca (calçados) e muitas outras cidades.

        A primeira guerra mundial marcou em São Paulo uma grande virada econômico-social: as exportações de café caíram de £ 46,4 milhões em 1912 para £ 19,0 milhões em 1918, arrastando muito grandes fazendeiros à crise. Paralelamente cresceram as exportações de feijão (55 mil toneladas em 1918), de arroz (22 mil toneladas em 1917), etc., produzidos principalmente pelos colonos de café[89] e assim "durante a conflagração européia de 1914-18 as velhas regiões do Estado, impossibilitadas de vender as colheitas cafeeiras a preços remuneradores, apresentavam a extravagante anomalia econômico-financeira de fazendeiros empobrecidos e colonos enriquecidos; a alta dos preços dos cereais favoreceu sobremaneira aquela situação"[90].

        Assim sendo, as duas primeiras décadas do século XX marcaram em São Paulo a aceleração do crescimento industrial, pela multiplicação gigantesca das iniciativas empresariais, graças à dinâmica e numerosa pequena produção mercantil, e assim da concorrência, que explica porque representando 16,5% do parque industrial brasileiro, São Paulo dispunha de 72,2% da potência elétrica industrial em 1907, distanciando-se tecnicamente dos demais produtores, inclusive do Rio de Janeiro. Este processo correspondeu à ascensão de parte dos colonos de café à condição de pequenos proprietários rurais e dos empresários industriais imigrantes (comerciantes de importação, numerosos pequenos capitalistas, etc.) à hegemonia da transição ao capitalismo moderno, paralelamente à decadência da aristocracia tradicional paulista da condição de empresários industriais e grandes proprietários rurais até então dominantes. Em 1935, num levantamento oficial que abrangeu 714 empresas industriais paulistas, 72,9% detinham origem não luso-brasileira[91].

        As colocações que acabamos de fazer entram em choque com as teses muito freqüentes segundo as quais a industrialização paulista esteve ligada basicamente à transferência de capitais da cafeicultura à indústria[92]. Mesmo analistas de esquerda confundiram a questão das relações sociais ligadas à industrialização, quando se negaram a encarar de frente o papel da imigração no processo, com receio de resvalarem na ideologia do "self made mal"[93]. Entretanto os levantamentos estatísticos de E. Willems datados de 1950 e de L.C. Bresser Pereira datados de 1962, ambos referentes a metrópole paulistana, mostram a insignificância da contribuição dos fazendeiros de café ao processo de industrialização[94]. Como explicar a ênfase, sempre reiterada no papel dos fazendeiros, visivelmente pequena? A medida em que esta classe social entrou em decadência econômica no início do século XX e sobretudo durante a primeira guerra mundial, para preservar sua posição política hegemônica até 1930, e mesmo depois seus interesses crescentemente contestados, ela precisava compensar, mantendo viva e intacta sua imagem de dinamismo e sua presença no campo político e das idéias (Semana de Arte Moderna, passado bandeirante, PD, USP, etc.).

        Na verdade, a nível de regionalização do processo de industrialização, poderemos nos perguntar se não há, à maneira da divisão norte-sul na Itália, outra semelhante no Brasil, que englobe na região industrial dinâmica a maior parte do Brasil meridional?

 

3. A revolução de 1930 e a industrialização brasileira

        A revolução de 1930 teve relação direta com o período depressivo do 3º Kondratieff (1920-1948) e com o fim da hegemonia industrial britânica e da economia agro-exportadora, inaugurando o período de expansão da economia nacional sob dinamismo próprio, que interessava tanto às oligarquias rurais regionais voltadas ao mercado interno, como aos industriais que puderam acelerar o processo de substituição de importações[95].

        A era de progresso que a reinserção na DIT em meados do século XIX havia proporcionado à economia brasileira, com a expansão do setor agro-exportador, parecia se esgotar na década de 1920-30. A queda do nosso comércio exterior durante a grande depressão mundial iniciada em 1873, havia estimulado e tinha sido compensada pela substituição artesanal e manufatureira urbana de importações (calçados, chapéus, charutos-cigarros, móveis, instrumentos de trabalho, etc.). Por outro lado, a manutenção a partir de 1879 de tarifas altas sobre produtos importados, com finalidade basicamente fiscal, havia garantido o início da substituição industrial de importações (tecidos), mesmo com o restabelecimento do comércio exportador após 1885. Assim, a economia brasileira crescia tanto nas fases de expansão, como de contração da DIT[96]. Com o grande crescimento das nossas produções para exportação nos fins do século XIX e inícios do XX e concomitante inelasticidade dos mercados das economias centrais, começaram a ocorrer as primeiras superproduções, que deprimiam os preços, como no exemplo da safra de café, que saltou dos 2,6 milhões de sacas em 1888 para os 8,0 milhões em 1902, já em grave crise que levou ao acordo de Taubaté (1906), visando a sustentação dos preços internacionais[97].

        A política de sustentação dos preços do café, inaugurada pelo acordo de Taubaté, acabou tendo conseqüências no conjunto da economia brasileira, pois à medida que os preços eram sustentados: 1) tomavam-se empréstimos no exterior, Inglaterra sobretudo, que o conjunto da economia brasileira tinha que pagar, 2) estimulava-se, involuntariamente, o aumento da produção e assim novas super-produções. Esta política, conjuntural inicialmente, passou a ser permanente a partir de 1926, com o governo Washington Luís, criando crescente oposição dos setores econômicos e regiões prejudicados[98].

        A substituição de importações, que havia vencido o grande desafio da primeira guerra mundial, continuava avançando tanto no setor têxtil, como em novas áreas. A Cia. Siderúrgica Mineira, logo adquirida pela ARBED, iniciava em 1921 a produção de aço, que havia sido estimulado pelo grande aumento da produção de ferro gusa durante a guerra, assim como a Cia. Brasileira de Cimento Portland, com 70% de capitais canadenses, começava a produzir em 1926 em São Paulo[99]. Sob o estímulo do aumento da produção de 1922-23, os industriais de tecidos de algodão ampliaram suas instalações e enveredaram nas últimas substituições de importações possíveis no ramo, os têxteis de luxo (felpudos, gobelins, etc.), mas foram surpreendidos em 1925-26 com as exigências dos financiadores ingleses da política de sustentação do café de abertura do mercado brasileiro às importações industriais, que acabaram provocando queda da produção interna[100].

        Em São Paulo, durante a década de 1920-30, processaram-se as maiores rupturas políticas, com o aparecimento do Partido Democrático (1926) e da FIESP (1928), o primeiro rompendo com o PRP, que tinha a hegemonia política nacional e o segundo com a Associação Comercial e Industrial de São Paulo. O PD refletia descontentamento dos grandes cafeicultores que sofreram perdas durante as crises do início do século e da primeira guerra mundial e adotava uma postura anti-industrialista, tendo dado origem à UDN (1945), que reuniu setores agrários decadentes da economia cafeeira (São Paulo e Rio de Janeiro) e do açúcar (Nordeste). A FIESP surgiu da necessidade dos industriais se desvencilharem do grande comércio importador paulista, do qual tinham sido uma dissidência, pois se viam prejudicados pela política de importações patrocinada pelo governo central, decorrência da sustentação do café. Enquanto a frente paulista ia se rompendo, o Rio Grande do Sul se unia em torno da política de valorização do mercado interno. Com a crise mundial de 1929, o governo Washington Luís abandonou a política de sustentação de preços do café, para poder aumentar as exportações e assim acabou perdendo o apoio dos cafeicultores[101]. Em 1930 perderam o poder o grande comércio importador, a cafeicultura paulista e a indústria inglesa, que estavam em coalizão desde 1888-89, tendo ascendido o latifúndio ligado ao mercado interno, a indústria brasileira e os bancos americanos, que foram solidificando sua aliança nas décadas de 1930 e 40[102].

        A oligarquia gaúcha, que liderava a aliança vitoriosa, era autoritária-reformista, de formação ideológica positivista, conduziu um processo de modernização pelo alto, a chamada via prussiana, como já havia acontecido na segunda metade do século XIX na Alemanha, Itália e Japão. Do ponto de vista econômico, em primeiro lugar, o poder vitorioso retomou a política de sustentação do café, já que a superprodução caracterizou o mercado até 1943-44, garantindo a manutenção da renda da cafeicultura. Mas no lugar da sustentação beneficiar basicamente o setor, ela teve em vista os interesses globais da economia, pelo caminho do controle, o que passou a permitir o uso seletivo das divisas, em direção às importações "essenciais" e em detrimento das importações "supérfluas". O uso dos recursos nacionais e governamentais, visando acelerar a substituição de importações, passou a ser submetido a um mínimo de planejamento, por órgãos criados após 30 como o Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial, Conselho Federal do Comércio Exterior e Comissão de Planejamento Econômico, nos quais participaram industriais corno B. Simonsen, tomando posições contrárias ao livre-comércio, a favor do protecionismo e do planejamento[103]

        Por outro lado, a substituição da Inglaterra pelos Estados-Unidos como poder hegemônico externo não criou empecilhos insuperáveis à industrialização, pois o poder no capitalismo americano era mantido pelo setor bancário, mais do que pelo industrial ao contrário da Inglaterra onde os bancos subordinavam-se às indústrias[104], o que garantiu financiamentos durante a segunda guerra mundial às companhias estatais nascentes (CVRD e CSN). Deve-se notar que antes de 1930, o Brasil mantinha relações internacionais triangulares, obtendo a maior arte das divisas dos Estados-Unidos (café) e gastando-as com importações de produtos industriais e financiamentos (café) ingleses. Assim, os Estados-Unidos não eram nossos grandes fornecedores de produtos industrializados, mas sim de derivados de petróleo, e com isto a revolução de 1930 não afetou nitidamente seus interesses industriais[105]. Já na Argentina a situação se colocou de outra maneira: o peso do setor agro-exportador frente ao setor de mercado interno era muito maior do que no Brasil e se voltava para o mercado consumidor inglês. Acabou reagindo defensivamente na década de 30, prendendo-se numa DIT em processo de superação e assim sua substituição de importações tornou-se mais lenta do que a brasileira.

        Com a crise mundial de 1929 a contração do comércio internacional brasileiro foi enorme: de £4,4B/ano/habitante no período 1921-30, caiu para £ 1,76 na década 1931-40[106]. O novo pacto de poder criado em 1930 tratou de acelerar o processo de substituição de importações: 1) usando seletivamente os recursos cambiais, como já se sublinhou, 2) retirando as barreiras fiscais internas entre as unidades estaduais, 3) financiando a produção por intermédio do Banco do Brasil, colocado sob a direção dos industriais, como na ampliação das empresas Klabin (papel), Pignatari (cobre) etc., 4) instituindo reservas de mercado, como no exemplo do carvão, obrigando o uso obrigatório de 10% (1931) e depois de 20% (1937) do produto nacional sobre o total consumido por cada usuário brasileiro, etc. A reação da industria à crise mundial, dada a capacidade ociosa existente em alguns ramos, foi imediata, assim como se consolidou nos anos seguintes aos estímulos da conjuntura e governamentais. A produção de carvão mineral aumentou de 27% de 1930 a 1931, a de tecidos de algodão aumentou de 30% e a de cimento aumentou de 95%[107].

        Como uma das medidas mais eficazes de apoio à industrialização não se deve esquecer a política trabalhista, que foi capaz de enfraquecer as organizações operárias combativas e instituir sindicatos atrelados ao Estado autoritário paternalista. A experiência em curso nas indústrias "alemães" do Rio Grande do Sul (Renner, por exemplo, onde havia trabalhado Lindolfo Collor), seguindo o modelo iniciado na Europa por Bismarck[108], foi a base empírica da nova legislação trabalhista[109]. Note-se que enquanto na Argentina, mesmo após a crise mundial, a industrialização sofreu pressões pelo lado "direito" (agro-exportadores), como pelo lado "esquerdo" (organizações operarias combativas), no Brasil a revolução de 1930 conseguiu superar estas duas pressões limitantes à acumulação industrial.

        Com o avanço da industrialização se acelerou a integração das economias até então fortemente regionais em torno de São Paulo. Na Amazônia, por exemplo, em contração enorme desde a crise da borracha da segunda década do século, ao lado da agricultura de subsistência que se estendeu no interior dos seringais substituindo importações pela via da economia natural, a parte da produção comercial da borracha que sobreviveu à crise, passou a ser destinada às indústrias de pneumáticos que surgiam no Rio de Janeiro e São Paulo, e, além disto, desenvolveram-se plantios de juta e de guaraná destinados às fábricas de sacos de juta e de refrigerantes localizadas igualmente no Sudeste[110].

 

Citações:

[1] Mayer, F. (1926) Agrarismo e industrialismo. Buenos Aires. Fritz Mayer foi o pseudônimo de Octávio Brandão, de tradição anarquista, que contribuiu desde 1922 para a implantação e crescimento do PCB e apontava a presença esmagadora de latifundiários no aparelho de Estado brasileiro na década de 20 e a necessidade de reforma agrária para a industrialização.

[2] Simonsen R. (1973) Evolução industrial do Brasil e outros estudos. São Paulo: Cia. Ed. Nacional., EDUSP, edição organizada por E. Carone. Simonsen foi fundador da CIESP (1928) e da FIESP e o líder industrial de maior prestígio no Brasil nas décadas de 30 e 40.

[3] Prado Jr., C. (1945) História do Brasil. São Paulo: Brasiliense, escrita originalmente para o Fondo de Cultura Económica (México).

[4] Rangel, I. (1957) Dualidade Básica da Economia Brasileira. Rio de Janeiro: ISEB, cujas idéias foram aplicadas por G. Paim (1957) Industrialização e Economia Natural. Rio de Janeiro: ISEB. Furtado, C. (1959) Formação Econômica do Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Fundo Cultura. Rangel e Furtado publicaram vários outros textos.

[5] Cardoso. F.H. (1960) “Condições sociais da industrialização de São Paulo”. Ver. Brasiliense nº 28, e Ianni. O. (1960) “Fatores humanos da industrialização no Brasil”. Ver. Brasiliense nº 30, procuraram apontar os fatores sociais da emersão do mercado interno e dos capitais para a industrialização, pouco abordados por C. Furtado.

[6] Simonsen, R. Evolução Industrial do Brasil. Op. cit., p. 49.

[7] Gudin, E. & Simonsen, R.C. (1978) A controvérsia do planejamento da economia brasileira. Rio de Janeiro: IPEA, 2ª ed., introdução de C. Von Doellinger. O pensamento de Gudin representava os interesses dos comerciantes de exportação e importação, das oligarquias agroexportadoras e do capital industrial da Inglaterra, todos derrotados pela revolução de 30, que discordavam que se transferissem, via Estado, recursos para as atividades industriais nascentes no Brasil, enquanto R. Simonsen defendia os interesses dos industriais brasileiros.

[8] Prebisch, R. (1950) El desarrollo económico de América Latina y algunos de sus principales problemas. Nova York: Cepal-ONU. Prebisch, alto funcionário do Banco Central da Argentina, desenvolveu suas idéias nas décadas de 30 e 40.

[9] Furtado, C. (1976) A economia latino-americana. São Paulo: Nacional, 2ª ed., p. 124.

[10] Mathias, G. (1983) O Estado Superdesenvolvido. São Paulo: Brasiliense, p. 139. Mathias faz a crítica da distinção entre fatores externos e internos das industrializações dos países latino-americanos, considerando que ambos participam de movimento único que compõe a economia mundial capitalista.

[11] Oliveira, F. (1981) A economia brasileira: crítica à razão dualista. Petrópolis: Vozes-Cebrap, 4ª ed., p. 13. O autor faz perigosa crítica às teorias cepalinas e dependentistas.

[12] Simonsen, R. Op. cit. e Furtado, C. Op. cit. Furtado apresentou vários capítulos sobre a economia cafeeira, no interior da qual se dá a gênese da industrialização, mas não tem um capítulo específico sobre essa gênese, conforme lembrou Martins, J.S. (1979) O cativeiro da terra. São Paulo: C. Humanas, p. 98.

[13] Mantega, G. (1984) A economia política brasileira. São Paulo: Polis-Vozes, 2ª ed., cap. IV e Breares Pereira, L.C. (1982) Seis interpretações sobre o Brasil. Rio de Janeiro: Dados, nº 3, p. 173 ss.

[14] Prado Jr., C. Op. cit., cap. Industrialização e Basbaum, L. (1957) História Sincera da República. Rio de Janeiro: Livraria São José, cap. Desenvolvimento Industrial e Capitalização.

[15] Cardoso, F.H. Op. cit. e Ianni, O. Op. cit.

[16] Dean, W. (1971) A industrialização de São Paulo. Difel, p. 41 e 108 e Peláez, C.M. (1972) História da industrialização brasileira. Rio de Janeiro: APEC.

[17] Furtado, C. (1979) “Brasil: da república ao estado militar”. In: Brasil tempos modernos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 3ª ed.: o texto original foi publicado na França em 1967.

[18] Frank, A.G. “Desenvolvimento do subdesenvolvimento latino-americano”. In: Pereira, L. Urbanização e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Zahar, 3ª ed.; publicado originalmente nos EUA em 1966.

[19] Evans, P. (1980) A tríplice aliança. Rio de Janeiro: Zahar.

[20] Mantega, G. Op. cit., cap. 5, sobretudo as idéias de R.M. Marini, próximas da 4ª Internacional e dos geopolíticos argentinos, como Guglialmelli, J.E. (1979) Geopolítica del Como Sur. El Cid Editor, p. 142.

[21] Oliveira, F. Op. cit., p. 12-3, onde as colocações dependendistas de F.H. Cardoso e E. Faletto são distintas das de A.G. Frank e R.M. Marini.

[22] Salama, P. (1976) O processo de subdesenvolvimento. Petrópolis: Vozes, entre outros autores adota a categoria “semi-industrializados"” Note-se que, desde 1973, M. Santos refere-se `economia brasileira como industrializada subdesenvolvida. Espaço e Sociedade. Petrópolis: Vozes, 1979.

[23] Roxborough, P. (1981) Teorias do subdesenvolvimento. Rio de Janeiro, cap. 9, foi o primeiro a indicar as relações entre a teoria da dependência e as tentativas de guerra de guerrilhas na América Latina, igualmente apontadas recentemente por F. Oliveira. Folha de São Paulo. 22/09/87.

[24] Castro, A.B. & Souza, F.E.P. (1985) A economia brasileira em marcha forçada. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

[25] Banco Mundial. Relatório anual – 1986. Rio de Janeiro: F.G. Vargas.

[26] Rangel, I. (1957) Introdução ao estudo do desenvolvimento econômico brasileiro. Salvador: Univ. da Bahia, apresentou as primeiras críticas à Cepal, expostas em debate em Santiago do Chile, 1954, com J. Ahumada, cujas idéias foram publicadas depois. Teorías y programación del desarrollo económico. Santiago: ILPES, 1967; Mantega, G. Op. cit. classifica, erroneamente Rangel como cepalino.

[27] Rangel, I. (1968) Dualidade básica... e o prefácio a R. Losada Aldana. Dialética do subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

[28] Singer, P. (1982) Desenvolvimento e crise. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 3ª ed. E Oliveira, F. Op. cit.

[29] Rangel, I. (1981) “História da dualidade brasileira”. São Paulo: Rev. Econ.Política. nº 4.

[30] Rangel, I. (1985) Economia: milagre e antimilagre. Rio de Janeiro: Zahar.

[31] Rangel, I. Introdução... Cap.3 e Oliveira, F. op. cit., p. 12 e seguintes.

[32] Vilar, P. Ouro e moeda na História: 1450-1920. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981, Cap. XVI e XVII discute as conseqüências negativas do ouro colonial no desenvolvimento capitalista da Espanha.

[33] Formulação clássica de Marx sobre o período mercantilista.

[34] Wallerstein, I. The modern world-system. N. York: Academic Press, 1974. Poderíamos dizer, apoiados em P. Vilar, discordando de I. Wallerstein e A.G. Frank, que os impérios coloniais ibéricos foram feudais, enquanto o Império Inglês já nasceu capitalista no século XVII.

[35] Rangel, I. Dualidade básica... Cap. 1 e 2 e Prefácio...; Novais, F. Estrutura e Dinâmica do Antigo Sistema Colonial. São Paulo: Cadernos CEBRAP 17, 1974.

[36] Sweezy, P. Capitalismo moderno. Rio de Janeiro: Graal, 1977, p. 131 e seguintes.

[37] Hobsbawm, E. As origens da Revolução Industrial. São Paulo: Global, 1979. A crise geral de economia européia no século XVII.

[38] FRANK, A.G. Acumulação mundial - 1492-1789. Rio de Janeiro: Zahar, 1977, p. 122 e seguintes; HUMBOLDT, A. Essai politique sur le royaume de la Nouvelle Espagne. Paris: Lib. J. Renouard, 2.ed. 1827. Humbold visitou em 1803 a cidade de Queretaro, no México, onde assinalou a existência de 20 grandes manufaturas têxteis e 300 pequenas, que transformaram naquele ano 970 toneladas de lã bruta, além da gigantesca manufatura real de cigarros, que empregava 3.000 pessoas, das quais 900 mulheres, conforme Cap. XII do livro V. Deve-se lembrar que na Espanha a manufatura real de cigarros localizava-se, na mesma época, em Sevilha, num prédio tão grande, que abriga hoje a Universidade.

[39] MAGALHÃES GODINHO, V. Le Portugal, les flottes du surce et les flottes de l’or. In: Serrão, J e Martins, G. Da indústria portuguesa. Lisboa: Horizonte, 1978, p. 223 e seguintes, onde aponta as depressões comerciais de 1670-1690, 1716 e anos seguintes, 1769-1778, 1808-1826, 1834-1850 etc., as duas últimas ligadas aos ciclos longos industriais ingleses; VICENS-VIVES, J. Manual de história econômica de España. Barcelona: Ed. Vicens-Vives, 5.reed., 1979, Cap. 30 aponta, igualmente, reações manufatureiras na Catalunha no final do século XVII, na mesma linha de Vilar, P. La Catalogne dans l’Espagne Moderne, tome I, Paris: Le Sycomore, 1982, p. 638 e seguintes; MARTINS, R.B. A indústria têxtil doméstica de Minas Gerais no século XIX. In: 2º Seminário sobre a economia mineira. Diamantina: DEDEPLAR-UFMG, 1983, enfatiza a tendência a auto-suficiência artesanal na economia mineira da segunda metade do século XVIII, discordando das colocações de C. Furtado (Formação...), que negou a reação endógena.

[40] F. Engels em 1892 foi o primeiro a chamar a atenção para a grande depressão da segunda metade do século XIX no prefácio à segunda edição alemã de La situacion des classes laborieuses en Angleterre. Paris: Costes, 1933. M. DOBB analisou a referida depressão em A evolução do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 1973 (primeira edição inglesa de 1945), pp. 366-391, assim como outros economistas marxistas, mas foi N. Kondratieff em 1926 o primeiro a sistematizar e explicar os ciclos longos em Las ondas largas de la coyntura. Madrid: Revista de Occidente, 1946.

[41] RANGEL, I. O Brasil na fase “b” do 4º Kondratieff. In: Ciclo, Tecnologia e crescimento. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982, lembra a referência de Schumpeter aos ciclos como não sendo simples amígdalas no corpo do capitalismo.

[42] NIVEAU, M. História dos fatos econômicos contemporâneos. São Paulo: Difel, 1969; MAURO, F. História econômica mundial. Rio de Janeiro: Zahar, 1973.

[43] NIVEAU, M. op. cit.; MAURO, F. op. cit.; BEAND, M. História do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1987.

[44] RANGEL, I. Dualidade básica... e Prefácio a R. Losada Aldana...

[45] RANGEL, I. A história da dualidade brasileira. Rev. Econ. Pol., nº 4, 1981, p. 17 e seguintes.

[46] ROSTOW, W.W. The world economy, history and prospect. Univ. Texas Press, 1978, citado por BEAUD, M. op. cit., p. 312.

[47] BRUIT, H. Acumulação capitalista na América Latina. São Paulo: Brasiliense, 1982, gráfico 2, p. 50 e RANGEL, I. A história da dualidade... quadros I e II, p. 34.

[48] RANGEL, I. Dualidade básica... e a Hist. dualidade.

[49] Deve-se notar que as fases depressivas dos ciclos longos foram não só no Brasil como também na península ibérica, América espanhola e outras regiões períodos de lutas sociais intensas, como a combinação entre lutas de classes e lutas entre dissidências regionais e o poder central em toda a América Latina de 1820 a 1850, conforme indicou para o Brasil I. RANGEL, I. A hist. dualidade...

[50] MURMIS, M. e PORTANTIERO, J.C. Estudo sobre as origens do peronismo. Cap. 1. São Paulo; Brasiliense, 1973; MAMIGONIAN, Armen. O processo de industrialização da América Latina: o caso brasileiro. São Paulo: Orientação USP nº 8, 1988.

[51] Jovellanos e Visconde de Cairu foram exemplos de “liberais”. JOVELLANOS, G.M. (1744-1811), político e economista espanhol, defendia o livre-comércio e exerceu grande influência da América espanhola. Cf. SILVA HERZOG, J. Antologia del pensamiento economico-social I, México: Fondo de Cultura Económica, 1963, pp. 280-290. L. Alamán e Alves Branco foram exemplos de ministros protecionistas no México e no Brasil da primeira metade do século XIX. Deve-se notar que as idéias protecionistas apareciam em todos os quadrantes em que se combatiam o domínio inglês, como mostra a publicação em 1841 de “Sistema nacional de economia política”, de F. LIST.

[52] PANIKKAR, K.M. A dominação ocidental na Ásia. 3.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977; PRADO JR., C. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1945; HERRERA CANALES, I. El comercio exterior de México: 1821-1875. México: El Colegio de México, 1977.

[53] O Banco de Avio funcionou de 1830 a 1842, tendo se constituído num banco estatal de desenvolvimento econômico. O período 1837-1846 foi radicalmente protecionista, visando proteger as quatro fábricas de tecidos de algodão já em funcionamento em 1837 e financiadas pelo referido banco, além de outras quatro em implantação. O número de teares mecânicos que em Puebla era de 60 em 1838, alcançou (540 em 1843) 1889 em todo o país. POTASH, R.A. El Banco de Avio de México. México: Fundo de Cultura Econômica, 1959, cap. XI e XII.

[54] souza franco, B. Os Bancos do Brasil. Brasília: Ed. UnB, 1984, apontava em 1848 as “instituições de crédito como o mais poderoso meio de aproveitar os capitais desempregados” visando fomentar as atividades econômicas. A tarifa Alves Branco elevou os impostos sobre importações de 15% a 30%, cf. PRADO JR., C. op. cit.

[55] HERRERA CANALES, I. op. cit., p. 119; Exposição do Visconde de Mauá aos credores da Mauá & C. e ao público. Rio de Janeiro, 1878, p. 8 e seguintes; a Real Fábrica de Ferro São João do Ipanema foi fechada em 1860, recuperou-se durante a guerra do Paraguai para decair em seguida.

[56] BAIROCH, P. Commerce extérieur et développment économique de l’Europe au XIX’siécle. Paris: Mouton, 1976; VILELA LUZ, N. A luta pela industrialização do Brasil. São Paulo: Alfa Ômega, 1978, cap. 1 e 2.

[57] RANGEL, I. Dualidade básica... e A história dualidade.

[58] CARDOSO, C.F.S. Agricultura, escravidão e capitalismo. Petrópolis: Vozes, 1979, cap. IV; BENCI, J. Economia cristã dos senhores no governo dos escravos. São Paulo: Grijalbo, 1977 refere-se ao “costume que praticam alguns senhores neste Brasil, os quais achando dificuldade em dar o sustento aos escravos, que os servem das portas a fora nas lavouras dos engenhos, lhes dão em cada semana um dia, em que possam plantar e fazer seus mantimentos”, p. 58. ANTONIL, A.J. Cultura e opulência do Brasil. Bahia: Livr. Progresso, 1955, faz referências semelhantes, p. 52.

[59] MARTINS, R.B. A indústria têxtil doméstica de Minas Gerais no século XIX. In: 2º Seminário sobre a economia mineira. Diamantina: DEDEPLAR, 1983, p. 81.

[60] MAMIGONIAN, Armen. Inserção de Mato Grosso ao mercado nacional e gênese de Corumbá. In: GEOSUL, nº 1. Florianópolis: Ed. UFSC, 1986, p. 41 e seguintes; SANTOS, M. O Espaço dividido. Rio de Janeiro: Livr. F. Alves, 1979.

[61] RANGEL, I. Dualidade básica... e PAIM, G. Industrialização e economia natural. Rio de Janeiro: ISEB, 1957.

[62] VILELA LUZ, N. op. cit., cap. 1.

[63] VON ESCHWEGE, W.L. Pluto Brasiliensis. Vol. II. São Paulo: Cia Ed. Nacional, p. 346 e seguintes; NIZZA DA SILVA, M.B. A primeira gazeta da Bahia: Idade d’ouro do Brasil. São Paulo: Cultrix, 1978, p. 81 e seguintes.

[64] RANGEL, I. A história dualidade... quadro I, p. 34.

[65] VILELA LUZ, N. op. cit., p. 23 e seguintes.

[66] SUZIGAN, W. Indústria brasileira: origem e desenvolvimento. São Paulo: Brasiliense, 1986, tabela 20, p. 384 e seguintes; PAULA, J.A. Dois ensaios sobre a gênese da industrialização em Minas Gerais: a siderurgia e a indústria têxtil. In: 2º Seminário... e CANABRAVA, A. O desenvolvimento da cultura do algodão da província de São Paulo (1861-1975). São Paulo, p. 275 e seguintes, assinalam o aparecimento e fracasso do primeiro estabelecimento industrial têxtil em Minas Gerais e São Paulo respectivamente.

[67] SOUZA FRANCO, B. op. cit., cf. nota 24.

[68] RANGEL, I. A hist. dualidade..., p. 21.

[69] PAIM, G. op. cit., p. 27 e seguintes, onde se lembra que no Brasil durante o período pombalino “esses tecidos grosseiros eram por demais baratos para suportar despesas de comercialização, muito altas, e não interessava a Portugal, por conseguinte, exportá-los para a colônia”.

[70] BUARQUE DE HOLANDA, S. Caminhos e fronteiras. Op. cit.; HILAIRE, A.S. Viagens...

[71] PAIM, G. op. cit.; MARTINS, R.B. op. cit. e PAULA, J.A. op. cit.

[72] PAULA, J.A. op. cit., p. 54; Martins, R.B. op. cit., p. 83 e seguintes.

[73] VON ESCHWEGE, W.L. Pluto Brasiliensis. 2º vol. São Paulo: Nacional, p. 436 e seguintes; PAIM, G. op. cit., p. 35 e seguintes; PAULA, J.A. op. cit., p. 21 e seguintes. O projeto do intendente Câmara abrangia duas grandes unidades siderúrgicas (São Paulo e Minas Gerais), que abasteciam o Brasil e exportariam para a Prata.

 

[74] RANGEL, I. A história dualidade... quadro I, p. 34; PAIM, G. op. cit., cap. 2.

[75] VILELA LUZ, N. op. cit., p. 27 e seguintes; e p. 35 sobre as “fábricas nacionais”, a maioria das quais eram na verdade grandes manufaturas; Rangel, I. A história dualidade... p. 24 e 25.

[76] RANGEL, I. A história dualidade..., p. 24 e 25; PAIM, G. op. cit., cap. 2.

[77] RANGEL, I. A história dualidade..., p. 25; NOGUEIRA DA SILVA, M.R. Negro na rua. São Paulo: Hucitec, 1988, p. 34; SOARES, L.C. A manufatura na formação econômica e social escravista no Sudeste. Niterói: UFF, 1988. Mimeo.

[78] SUZIGAN, W. op. cit., tabela 20; VERSIANI, F.R. Industrialização e economia de exportação: a experiência brasileira antes de 1914. Rev. Bras. Econ. Vol. 34, nº 1, 1980, anexo 1; VILELA LUZ, N. op. cit., cap. 2.

[79] STEIN, S.J. Origens e evolução da indústria têxtil no Brasil - 1880-1950. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1979, p. 35 e seguintes; CANABRAVA, A.P. O desenvolvimento da cultura do algodão na província de São Paulo (1861-1875). São Paulo, p. 175 e seguintes.

[80] SUZIGAN, W. op. cit., p. 148.

[81] MAMIGONIAN, A. Notas sobre os frigoríficos do Brasil Central Pecuário. São Paulo: EPG nº 51, 1976; EISENBERG, P. Modernização sem mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1972.

[82] SUZIGAN, W. op. cit., p. 122 e seguintes; Censo Industrial, 1907, p. 261.

[83] SUZIGAN, W. op. cit., p. 232 e seguintes; Censo Industrial, 1907, mapas estatísticos da indústria fabril; CORREA DO LAGO, L.A. et alii. A indústria brasileira de bens de capital. Rio de Janeiro: FGV, 1979, cap. 2.

[84] STEIN, S.J. op. cit., p. 36.

[85] STEIN, S.J. op. cit., p. 41.

[86] STEIN, S.J. op. cit., cap. 6.

[87] PEREIRA DE MELO, M.C. Máquina e trabalho: um estudo das relações de trabalho na indústria têxtil do Maranhão (1940-60). Pernambuco: UFPE, 1983. Mimeo, p. 41 e seguintes; PASSOS SOBRINHO, J.M. História econômica de Sergipe (1850-1930). Campinas, IFCH-UNICAMP, 1983. Mimeo, p. 119 e seguintes.

[88] CANABRAVA, A.P. op. cit., p. 275; PAIM, G. op. cit., p. 46; MAMIGONIAN, A. O processo de industrialização em São Paulo. BPG, nº 50, 1976 e seguintes.

[89] DENIS, P. Amérique du Sud. Vol. I. Paris: A. Colin, 1927, p. 199; MANGONION, A. O desenvolvimento econômico do Estado de São Paulo. Rio de Janeiro: IBGE-BG nº 42, 1946.

[90] GIOVANETTI, B. Esboço histórico da Alta Sorocabana. São Paulo: Rev. Trib., 1943, p. 75.

[91] Anuário industrial 1970, p. 148, onde se vê que 18,6% do parque industrial paulista era eletrificado, contra apenas 5,4% na Guanabara; WILLENS, E. Brasil. In: The positive contribution by inmigrants. Paris: UNESCO, 1955, p. 129 e seguintes.

[92] FURTADO, C. op. cit.; DEAN, W. A industrialização de São Paulo. São Paulo: Difel, 1971, p. 41 e seguintes; CARDOSO DE MELLO, Z.M. Metamorfose da riqueza: São Paulo 1845-1895. São Paulo: Hucitec, 1986.

[93] IANNI, O. Fatores da Industrialização no Brasil. São Paulo: Rev. Brasiliense, nº 30, 1960.

[94] WILLENS, E. op. cit., p. 133; BRESSER PEREIRA, L.C. Origens étnicas e sociais do empresariado paulista. São Paulo: Rev. Adm. Empr., junho 1964

[95] FAUSTO. B. A revolução de 1930. São Paulo: Brasiliense, 1970.

[96] Esta constatação fundamental para a análise da história econômica brasileira é devida a I. Rangel - A história dualidade... e supera a discussão sobre crescimento maior ou menor da industrialização nos períodos de maior ou menor inserção na DIT, travada por C.M. Paláez - História da Industrialização brasileira. Rio de Janeiro: APEC, 1972, ao criticar C. Furtado - op. cit.

[97] SIMONSEN, R. op. cit., p. 213.

[98] FAUSTO, B. op. cit., p. 19 e seguintes, baseado em A. Delfim Netto.

[99] PELÁEZ, C.M. op. cit., p. 141 e seguintes.

[100] Em 1922 produziram-se no Brasil 628,6 milhões de tecidos de algodão, que subiram a 939,8 em 1923 e caíram para 582,0 (1928) e 478,0 (1929), conforme Repertório Estatístico do Brasil, quadros retrospectivos nº 1, IBGE, 1941, p. 39.

[101] FAUSTO, B. op. cit., p. 32 e seguintes; TRINDADE, H. Aspectos políticos do sistema partidário, riograndense (1882-1937). In: Economia & Política. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1979, p. 166 e seguintes.

[102] RANGEL, I. A história dualidade... op. cit.

[103] DINIZ, E. Empresário, Estado e Capitalismo no Brasil: 1930-1945. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978; GUDIN, E. e SIMONSEN, R. A controvérsia do planejamento na economia brasileira. Rio de Janeiro: IPEA, 2.ed. 1978.

[104] RANGEL, I. A história dualidade... op. cit.

[105] RANGEL, I. Dualidade básica... op. cit., cap. 4 e 5.

[106] RANGEL, I. A história dualidade... op. cit., quadro I.

[107] Repertório Estatístico do Brasil, op. cit., p. 20, 39 e 43.

[108] KENT, G.O. Bismark e seu tempo. Brasília: Ed. UnB, 1976; ROSAVALLON, P. La crise de l’Éfat-providence. Paris: Ed. Seuil, 1981.

[109] MUNAKATA, K. A legislação trabalhista no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1981; FAUSTO. B. Estado, trabalhadores e burguesia (1920-1945). São Paulo: Novos Estudos CEBRAP, nº 20, 1988.

[110] LOBATO CORRÊA, R. A periodização da rede da Amazônia. Rio de Janeiro: IBGE-RBG nº 3, 1987.

 

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