Por que a Veja mente, mente, mente, desesperadamente?*
Emir Sader**
Veja é a pior revista do
Brasil. Não é um título fácil de obter, porque ela tem duros competidores –Isto
É, Época, Caras, Isto é Dinheiro, Quem? etc. etc. Mas Veja se esmera na arte da
vulgaridade, da mentira, do sensacionalismo, no clima de “guerra fria”, em que
a revista defende as cores do bushismo no Brasil. A revista, propriedade
privada da família Civita, merece o galardão.
Todo país tem esse tipo de
publicação extremista, que defende hoje prioritariamente os ideais dos novos
conservadores estadunidenses. Herdam os ideais da guerra fria, se especializam
em atacar a esquerda, reproduzem as mesmas matérias internacionais e as
bobagens supostamente científicas sobre medicamentos, tratamentos de pele, de
problemas psicológicos, de educação, para tentar passar por uma revista que
atende a necessidades da família.
Seus colunistas são o
melhor exemplo da vulgaridade e da falsa cultura na imprensa brasileira. Uma
lista de propagandistas do bushismo, escolhidos seletivamente, reunindo a
escritores fracassados, a ex-jornalistas aposentados, a autores de auto-ajuda,
a profissionais mercantis da educação, misturando-se e mesclando esses temas em
cada uma das colunas e nos editoriais do dono da revista. Uma equipe editorial
de nomes desconhecidos cumpre a função de “cães de guarda” dos interesses dos
ricos e poderosos – que, em troca, anunciam amplamente na revista – de plantão.
O MST, o PT, a CUT, os
intelectuais críticos - são seus alvos prioritários no Brasil. Para isso tem
que desqualificar o socialismo, Cuba, a Venezuela, assim como tudo o que
desminta o Consenso de Washington, do qual é o Diário Oficial no Brasil.
Só podem fazer isso
mentindo. Mentindo sobre o trabalho do MST com os trabalhadores do campo, nas
centenas de assentamentos que acolhem a centenas de milhares de pessoas,
famílias que viveram secularmente marginalizadas no Brasil. Têm que esconder o
funcionamento do sistema escolar nacional que o MST organizou, responsável, entre
outras tantas façanhas, de ter feito mais pela alfabetização no Brasil do que
todos os programas governamentais. A Veja não sabe o que é agricultura
familiar, com sua mentalidade empresarial se soma ao agronegócio, aos
transgênicos e à agricultura de exportação. Ao desconhecer tanta coisa, a Veja
tem que mentir para esconder tudo isso dos leitores, passando uma imagem
bushiana do MST.
Mentem sobre Cuba, porque
escondem que nesse país se produziu a melhor saúde pública do mundo, que ali
não há analfabetos – funcionais ou não -, que por lá todos tem acesso – além de
saúde, educação, casa própria, a cultura, esporte, lazer. Que o IDH de Cuba é
bastante superior ao brasileiro.
A Veja tem que mentir
sobre a Venezuela, país em que se promove a prioridade do social, com ¼ dos
recursos obtidos com o petróleo irrigando os programas sociais. Que o governo
de Hugo Chávez triunfou sobre a mídia privada golpista – as Vejas de lá -, pelo
apoio popular que granjeou, quando a Veja, defasada – como sempre – já noticiava
na sua capa a queda de Chávez. Depois o governo venezuelano derrotou a oposição
em referendo previsto na Constituição daquele país, em que os eleitores, no
meio do mandato, se pronunciam sobre a continuidade ou não do governo, em um
sistema mais democrático que em qualquer outro lugar do mundo.
A Veja mente sobre os
efeitos da globalização neoliberal, que concentrou renda como nunca na história
da humanidade, que canaliza recursos do setor produtivo para o especulativo,
que cassa os direitos básicos da grande maioria da população, que não retomou o
crescimento econômico, como havia prometido.
A Veja mente quando
anunciou a morte do PT, no mesmo momento em que mais de 300 mil membros do
partido, demonstrando vigor inigualável em qualquer outro partido, foram às
urnas escolher, por eleição direta, seus novos dirigentes, apesar da ruidosa e
sistemática campanha da mídia bushista brasileira.
A Veja mente para tentar
demonstrar que a política externa brasileira é um fracasso, quando ninguém,
dentre os comentaristas internacionais, daqui ou de fato, acha isso. Ao
contrário, a formação do Grupo dos 20 na última reunião da OMC, o bloqueio ao
inicio de funcionamento da ALCA – lamentado pela revista bushista.
A Veja mente, mente,
mente, desesperadamente, porque suas verdades são mentiras, porque representa o
conservadorismo, a discriminação, a mentalidade mercantil, a repressão, a
violência, a falsa cultura, a vulgaridade – enfim, o que de pior o capitalismo
brasileiro já produziu. Choca-se com o humanismo, a democracia, a socialização,
os interesses públicos. Por isso, para “fabricar consensos” – conforme a
expressão de Chomsky, a Veja mente, mente, mente, desesperadamente.