Zeno Soares Crocetti *

 

  Estamos convencidos de que a mudança histórica em perspectiva provirá de um movimento de baixo para cima, tendo como atores principais os países subdesenvolvidos e não os países ricos; os deserdados e os pobres e não os opulentos e outras classes obesas; o indivíduo liberado, partícipe das novas massas, e não o homem acorrentado; o pensamento livre e não o discurso único. Os pobres não se entregam e descobrem a cada dia formas inéditas de trabalho e de luta; a semente do entendimento já está plantada e o passo seguinte é o seu florescimento em atitudes de inconformidade e, talvez, rebeldia”.

Milton Santos

 

Quando em reunião da AGB Curitiba, decidimos por criar uma vinheta (espaço & memória) em nossa Revista Paranaense de Geografia, para homenagear grandes geógrafos através de seus textos, jamais pensei um dia estar escrevendo um texto introdutório de uma homenagem póstuma ao Professor Milton, principalmente num país pouco acostumado a glorificar seus expoentes, como ele mesmo não se cansava de denunciar.

Escrever sobre Milton Santos exige reflexão, memória, respeito e celebração, assim, não posso me esquecer quando o vi pela primeira vez, em 1988, na sala de recepção do Hotel Lancaster, em Curitiba, por ocasião de sua conferência, sobre o papel do Geógrafo no Terceiro Mundo, conferência proferida no Salão nobre da Caixa Econômica Federal, no centro de Curitiba. Em conversas reservadas ele deixou transparecer que uma das maiores angústias da sua vida foi a sua saída do Brasil, seu exílio por conta do golpe militar de 1964.

Em março de 2001 foi meu último encontro com o mestre na USP, ou melhor no seu gabinete de trabalho, onde trabalhou correndo contra o tempo, pois como ele mesmo disse, em minha vida já fiz muitas concessões, e não vou fazer mais concessões à minha doença, ele tinha pressa de vida.

        Quando lançou seu mais recente trabalho; O Brasil: território e sociedade no início do século XXI, ele nos cobrava uma nova centralidade, na interpretação da formação territorial do Brasil. Para tanto, conclamo aqueles que sempre estiveram do seu lado, seus admiradores, enfim, precisamos manter sua posição no front, para continuar seu trabalho, que em sua vida acadêmica ou em sua militância política, sempre foi fiel aos ideais de construção de uma sociedade mais justa e democrática. O Brasil perde um grande homem  concorde-se ou não com suas idéias.

 


*Professor de geografia e práticas instrumentais em cursos livres de especialização e treinamento de professores, autor de livros didáticos e paradidáticos, sócio da AGB-Curitiba.


Referência: CROCETTI, Zeno Soares. Milton, Gente brasileira, Revista Paranaense de Geografia, Nº 7, Curitiba, p. 113-115, 2002


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